sexta-feira, 27 de maio de 2011

A sexta disciplina: solitude

Uma coisa é estar solitário e outra coisa diferente é estar sozinho. Chamei esta disciplina de “A Disciplina da Solitude” porque, embora os dicionários afirmem que seu significado é o mesmo que solidão, pelo fato de ser muito menos utilizada posso me permitir atribuir-lhe um outro significado aqui. Solitude, então, seria estar sozinho sem estar, contudo, sofrendo por isso. A solidão é a mais perfeita antítese do caráter de Deus, não foi inventada por Ele, Ele quer bani-la do Universo, enfim, não tem nada a ver com Ele, mas a solitude tem. E muito.

Mais uma vez, o melhor exemplo que temos dessa disciplina posta em prática está no próprio Jesus. Para se preparar para Seu ministério, Ele passou quarenta dias sozinho (Mateus 4). Antes de escolher os discípulos, passou uma noite sozinho (Lucas 6:12) e depois de haver efetuado a multiplicação miraculosa dos pães, insistiu com Seus discípulos para ser deixado sozinho, em oração (Mateus 14:23). Apenas alguns poucos exemplos para demonstrar que nosso Mestre sistematicamente buscava a solitude.

O medo da solidão, cujo nome científico é isolofobia, é um dos mais fortes que existem e uma multidão incontável se sujeita a situações degradantes por causa dele. Além disso, vivemos em um tempo que não se dá muito bem como a solitude. É cada vez mais comum notarmos que perdemos o chão de sob os pés se não temos um fone de ouvidos, o rádio ligado, a TV ligada ou algum outro tipo de ruído que nos dê a sensação – de resto falsa – de que não estamos sós. Mas é imprescindível optar pela solitude e pelo silêncio, porque é ali que organizamos nossos pensamentos, é ali que reavaliamos nosso rumo, nossas metas e objetivos de vida, é ali que nos educamos para ser capazes de ouvir a voz de Deus. Aliás, solitude e silêncio são dois lados da mesma moeda, andam de mãos dadas e devemos nos habituar com eles, nos sentir confortáveis neles.

Schwantes, no clássico “Colunas do Caráter”, cita o psiquiatra Robert Lindner, afirmando que ele “deplora ‘o abandono daquela solidão que era ao mesmo tempo a marca da adolescência e a fonte de seus mais profundos desesperos e de seus êxtases cheios de dúvida. E frequentemente esta solidão era criadora. E dela por vezes surgiam sonhos, as esperanças e aspirações ascendentes que carregavam a vida daí em diante de significado, e contribuíam para nos dar poetas, artistas e cientistas... Mas a juventude de hoje trocou a solidão pelo estouro da boiada, pelo agrupamento predatório, pelas grandes coletividades que enterram, se não destroem a individualidade”.

A solitude pode ser uma disciplina, ou seja, algo que você faz, algo que você opera positivamente. Para mim o tema é especialmente espinhoso porque sou pai de dois meninos pequenos e tenho um círculo de amigos que é precioso demais para ser negligenciado e, por isso, demanda tempo e atenção. Assim mesmo, tenho alcançado algumas vitórias nesse campo, encontrando momentos em que posso estar sozinho e em silêncio. Alguns desses momentos são altamente improváveis: pode ser em um metrô lotado ou correndo de manhã antes de ir trabalhar. Mas funcionam maravilhosamente bem. Estar sozinho é uma habilidade de desligar o mundo e olhar para dentro de si, buscando encontrar ali os bilhetes que Deus deixou para que fossem lidos. Além disso, é importante projetar, de tempos em tempos, momentos mais extensos de solitude, talvez uma tarde, um domingo ou um final de semana.

Jesus está aí para ser imitado. Não é à toa que Ele busca estar sozinho com tanta frequência. Se fizermos como Ele, descobriremos refestelados porque. Mas é bom que O imitemos em tudo, inclusive no equilíbrio entre solitude e interação social que Ele praticava. A solitude é boa em doses moderadas, porque no mais das vezes Deus nos quer no meio das pessoas, aprendendo com elas, praticando o amor ágape com elas e sendo o sal da terra e a luz do mundo.

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