sexta-feira, 27 de julho de 2012

O modelo (parte 8)


E perdoa-nos as nossas dívidas...
Mateus 6:12

O que é oração? Eu já li artigos e até livros inteiros sobre ela, mas não encontro na Bíblia nenhum compêndio teórico ou nenhuma digressão teológica sobre oração. Por isso, para entender qual a sua finalidade exata eu preciso olhar para as que estão registradas na Bíblia, de preferência a oração modelo, que Jesus ditou no monte, e pensar.

É nessa busca que volto ainda outra vez à palavra “Pai”, lá do início da oração, para só então pensar um pouco na razão pela qual Jesus incluiu na oração modelo um pedido por perdão. Ajustando didaticamente a relação do ser humano com Deus na moldura da relação pai-filho, Jesus me faz enxergar o pleito por perdão de forma bem diferente do que seria numa outra relação qualquer.

Eu descobri o que é perdoar um filho e antes disso não fazia nem uma pálida ideia do sentimento envolvido nisso. A verdade é que, a rigor, meu filho não precisaria pedir perdão para recebê-lo. Ele não corre jamais o risco de ser deserdado ou de eu passar a amá-lo menos. Sei que embora isso aconteça algumas vezes por aí, não dá para conceber a ideia de um pai que passa tempo com seu filho, que se debruça sobre ele e faz questão de acompanhar o mínimo progresso cogite a hipótese de desprezá-lo.

Mesmo assim, eu muitas vezes insisto com meu filho para que peça perdão. Sinto quase instintivamente que ele precisa disso para crescer. Precisa entender que alguns de seus atos ofendem, mas mais que isso: precisa ter a oportunidade de assegurar-se de que continua amado.

Vejo muitas relações familiares onde não se pronuncia a palavra perdão nem jamais se pede desculpa. Parte-se do pressuposto do amor incondicional e aí fica a impressão de que o pedido de perdão seria uma mera formalidade. Invariavelmente, contudo, nessas relações encontro uma série de assuntos mal resolvidos, sujeira sob o tapete e cicatrizes mal fechadas.

Todos nós temos dívidas e não podemos ser tudo o que fomos “projetados” pra ser sem a certeza do perdão. O perdão tem efeitos terapêuticos óbvios (a expressão aliviada de meu filho ao ser perdoado não me deixa mentir): liberta, estimula, impulsiona para a frente, gera crescimento. O perdão é, em suma, essencialmente divino.

Portanto, ao analisar a oração modelo, chego à conclusão de que não preciso pedir perdão para convencer Deus a me perdoar. Ele é Pai, não precisa ser convencido de nada, Ele quer o meu melhor sempre! Então, Jesus fez questão de incluir o clamor por perdão na oração modelo para certificar-Se de que não mais seríamos limitados pela culpa. “Peça perdão para ouvir que está perdoado. Você precisa disso e eu não quero negar nada do que você precisa”.

Minha Jerusalém particular


Você diz que Jesus Cristo é o seu exemplo em tudo assim, sorrindo como se estivesse dizendo que gosta de mousse de chocolate? É fácil para você fazer uma afirmação dessas? Será que já avaliou o custo?

Para servir de contraponto a toda essa leviandade no curto espaço que tenho aqui posso lhe apontar hoje a Jerusalém. Jerusalém estava sempre no pensamento de Jesus. Ele poderia estar se movendo pela Galileia, por outros cantos da Judeia, Samaria ou onde fosse, mas Jerusalém permanecia na periferia do olhar de Cristo como uma sombra onipresente e constante. Em algum momento Ele teria de rumar para lá. A vida inteira de Jesus foi coberta por essa sombra de cruz que Jerusalém produzia sobre Ele.

Quando chegou a hora, Ele caminhou decididamente para Jerusalém. Tentaram demovê-lo. Disseram que era perigoso. No caminho Ele teve alegrias e tristezas, vitórias e derrotas, boas surpresas e decepções. Mas absolutamente nada foi capaz de fazer com que Ele mudasse de rumo. Nada. Ele tinha uma missão a cumprir e o fato de essa missão lhe haver sido dada por Deus colocava em Jesus uma obstinação capaz de produzir nEle aquilo que Ele mesmo chamou de a maior demonstração de amor possível: dar a própria vida por Seus amigos (e o detalhe cruel da história é que foram esses amigos que o mataram). Ele conhecia Seu destino, Seu destino era dor, angústia, desprezo, injustiça, tortura e morte, mas sendo essa a vontade do Pai, Ele não hesitaria um segundo sequer em desempenhar o Seu papel.

Jerusalém é o símbolo máximo da submissão desse a quem chamamos de Mestre à vontade de Deus. “Porque eu desci do céu, não para fazer a minha própria vontade, e sim a vontade daquele que me enviou” (João 6:38), foram Suas palavras.

Talvez você e eu não tenhamos nenhuma Jerusalém, um lugar para onde sabemos que devemos rumar e morrer, mas o que fazemos com as miniaturas de Jerusalém para onde Deus nos pede constantemente para ir? Elas envolvem algum tipo de sacrifício - suportar gente que não pode nos dar nada em troca, subtrair tempo de lazer ou descanso que teríamos, nos colocar em posição desconfortável, nos levar a abdicar de prazeres e conveniências, nos obrigar a adotar um estilo de vida mais simples e frugal ou que nos parece insosso e enjoativo, etc. Temos desculpas e justificativas excelentes para não ir.


Se essas miniaturas nos afugentam, que se dirá das maiores, aquelas obras grandiosas que Deus nos sonha desempenhando?

Então não deveríamos sair por aí dizendo que Jesus Cristo é nosso exemplo de vida a não ser que o façamos como se fosse uma oração: “Jesus Cristo é o meu exemplo de vida em tudo. Meu Deus, faça isso verdade!”

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Uma ambição mais alta


“Nunca deveríamos colocar nossos sonhos de sucesso como o propósito de Deus para nós”, afirmou Oswald Chambers. Ele explica porque: “temos uma ideia de que Deus está nos encaminhando para um fim específico, uma meta almejada; Ele não está. Alcançar um fim específico é um mero incidente. O que nós chamamos de processo, Deus chama de fim”.

Desde crianças ficamos empolgados com a história de José e de como ele foi traído pelos irmãos, vendido como escravo para uma terra estrangeira, aprisionado e, enfim, colocado como governador do Egito, tudo para conseguir salvar sua família da fome que veio durante o tempo das vacas magras. Ele passa a ser um herói nosso muito cedo, portanto, e conscientemente ou não, alimentamos a perspectiva de que há, em maior ou menor escala, um posto de governador do Egito esperando por nós em algum momento de nossa jornada.

Entretanto, desconsideramos o fato de que Deus poderia ter resolvido o problema da fome de outra forma qualquer, começando por evitar a própria seca que a ocasionou. Desconsideramos, também, o fato de que José é uma exceção à regra. Davi é outra exceção à regra. Podemos ser exceções também, claro, pode ser que tenhamos uma missão específica para realizar em um momento específico, mas Chambers tem razão quando afirma que Deus está interessado no processo inteiro e não em um clímax glorioso qualquer.

Nosso sonho é alcançar grandes alturas, mas, como diz o mesmo autor, “Seu [de Deus] propósito é que eu dependa dEle e em Seu poder agora. Que eu possa permanecer calmo e sereno no meio do tumulto, esse é o fim e o propósito de Deus”.

Essa percepção enche de significado os instantes mais banais de minha existência, aqueles nos quais eu sou tentado pelo Diabo a acreditar que “nada está acontecendo”. Sempre alguma coisa está acontecendo. Sempre alguma escolha está sendo tomada. Sempre um relacionamento está sendo alimentado. Ou negligenciado.

Isto é muito mais do que quinze minutos de glória por ter feito algo “grande”, por ter matado um gigante ou ter sido escolhido um sátrapa em Babilônio. Isto é uma existência inteira de confiança em Deus, uma glória que permanece pela eternidade sobre todas as outras, exatamente o tipo de sonho que Deus tem a seu respeito.

sexta-feira, 6 de julho de 2012

Para ser grande


Nesse mundão há um monte de pessoas com características positivas marcantes. Há os caridosos, os desinteressados, os gentis, os corajosos, os perseverantes, os conhecedores de teologia, os amorosos, os dedicados, os comprometidos e uma infinidade de outros. Mas quando Satanás chegou na presença de Deus após “rodear a Terra e passear por ela” (Jó 1:7), foi para um homem “íntegro, reto e que se desvia do mal” (verso8) que Deus apontou. Esse foi o grupo de qualidades que mereceu destaque especial. Deus não perguntou a Satanás se ele havia visto o mais caridoso, o mais corajoso, o mais dedicado nem o mais devoto, mas se havia visto alguém que era íntegro e que se desviava do mal.

Esse fato curioso é provavelmente reflexo de debates anteriores entre Deus e Satanás. A controvérsia que surgiu entre eles tem a ver com integridade, com coerência e com a disposição para se desviar do pecado. E, curiosamente, essas qualidades não tem uma ligação direta com teologia.

No final do primeiro capítulo de Jó o vemos atribuindo a Deus as desgraças que lhe ocorreram. Ele não sabe, como nós, que o autor de todas aquelas tragédias fora Satanás, e não Deus. Mesmo assim, aos olhos do injustiçado Deus, “Jó não pecou”.

Jó não apenas tinha um conceito errado sobre Deus, mas também sobre si próprio. É muito frequente termos uma noção distorcida sobre nós mesmos quando nossa visão de Deus é tacanha. No final do livro, quando Deus lhe apareceu e conversou com Ele, sua reação foi: “Com os ouvidos eu ouvira falar de ti, mas agora te veem os meus olhos. Pelo que me abomino, e me arrependo no pó e na cinza” (Jó 42:5 e 6). Ou seja: quando Jó percebeu que o conceito que tinha de Deus era pequeno e limitado demais, quando Ele se viu face a face com o Criador, percebeu que o conceito que tinha de si próprio era distorcido, pois no contraste com Deus só lhe restava “arrepender-se” e “abominar-se”.

Mas com toda essa ignorância, Jó não deixava de ser um homem reto, temente a Deus e que se desviava do mal. E era isso de que o próprio Deus se orgulhava. Era isso o que Ele procurava e queria ver em criaturas Suas.

Para sermos grandes é preciso apreciar a grandeza. Nunca seremos grandes mirando no que não é grande. Nunca seremos grandes sendo pessoas fragmentadas, partidas, divididas. Porque a integridade, a inteireza, é a característica número um da grandeza. Deus nos quer íntegros e sem mais incoerências internas. Ele está colocando à nossa disposição hoje o poder para não precisarmos abandonar nossos princípios conforme os ventos soprarem mais fortes. Ele fez o que era necessário para não precisarmos abrir concessões morais sufocadas sob uma montanha de desculpinhas esfarrapadas.

Antes, muito antes da melhor teologia e das outras boas qualidades todas, é preciso buscar o Senhor de todo o coração. Todo o coração significa o coração inteiro, o coração íntegro. E o que vem na esteira disso é a mais genuína e desejável das grandezas!