sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Fim do mundo? Yes!

Em 1988 a banda de rock alternativo americana R.E.M. lançou um single com a canção It´s the end f the world as we know it (and I feel fine), que teve relativo sucesso e que decerto está sendo executada um pouco mais do que o normal hoje. Houve um grande barulho em torno do fim do mundo supostamente profetizado pela civilização maia. Hoje, 21/12/2012 se encerraria um ciclo astrológico de 26 mil anos, o que levou grupos esotéricos a anunciar para a data nada menos que o fim do mundo. Hollywood e seu filme-tragédia 2012 se incumbiram de fazer o resto, ou seja, propagar a ideia por aí. O assunto foi tratado pela maior parte das pessoas com ironia, mas é curioso ver que na visão generalizada, "fim do mundo" é algo terrível, com o que não pode haver um "I feel fine" (eu me sinto bem) associado. A visão do fim do mundo como uma catástrofe a ser evitada é universal. Nos filmes de heróis, o mundo é sempre salvo da destruição pela atuação de uns poucos. Um outro exemplo bem didático é o filme "A Sétima profecia", estrelado por Demi Moore. Ele começa com os sete selos do Apocalipse sendo quebrados por Jesus, dando início a catástrofes localizadas. De repente o filme introduz uma crendice a respeito de uma sala de almas no paraíso. O mundo estaria acabando porque as almas lá estavam se
esgotando. É o bebê que a protagonista está gestando que "salva o mundo", repovoando a tal sala de alguma forma, e aí o Apocalipse foi cancelado. Todos respiram aliviados e podem seguir sua vida frágil, vulnerável, cheia de prazeres vãos, cheia de alegrias fugazes e projetos egoístas, interrompidos muitas vezes pela dor e pela solidão. Outra reação normal à febre do fim do mundo é pretender "aproveitar" os últimos momentos para fazer as coisas que você se negou, os desejos que você reprimiu. Já que amanhã não vai haver ninguém cujo juízo a seu respeito você precisa temer, então você pode fazer o que bem entender. Por trás desse conceito está a ideia de que a sociedade nos impõe normas de conduta restritivas e que a real felicidade está em dar um drible nelas e fazer o que seus hormônios pedem. O clima desde ontem à noite nos noticiários, inclusive nos mais "sérios", como o Jornal Nacional da Globo, era de piada. O sumo desse caldo é: acreditar no fim do mundo é coisa de idiota, o mundo vai continuar do jeito que está por longas e longas eras (e que isso é uma coisa ótima) e, já que o mundo continua, temos que dar um jeito de realizar nossos desejos aqui e agora. O Apocalipse, contudo (o livro da Bíblia e não, a ideia que fazem dele), diz que o fim do mundo é uma coisa muita boa. Diz que o fim do mundo é sinônimo de ponto final na história da dor, da morte, da solidão e da opressão e aí nenhum de nossos projetos para esta realidade aqui pode ser melhor do que isso. O livro de Daniel diz que o juízo final é praticado "a favor dos justos" (7:22), ou seja, não é "contra alguém", mas "a favor de alguém", é algo que serve para salvar e não destruir. Como somos seres moralmente livres para escolher, podemos optar por, através de Jesus, ser "justos" e assim viver no ambiente sem mais dor ou lágrimas, ou então experimentar a morte eterna. E "ser justo" implica em não ter mais o desejo de fazer aquelas coisas que o mundo confunde com "aproveitar a vida". II Pedro 3 afirma que "no final dos tempos" virão zombadores afirmando que tudo está como sempre esteve e que a promessa de Jesus é furada. Não é o que acontece hoje? Suas previsões todas se cumpriram à risca até aqui. Crer nessa última implica em ser alvo da zombaria do mundo que acha que o fim do mundo é conversa pra boi dormir, mas é um preço bem pequeno a se pagar. Se você conhece este Deus fantástico e já passou tempo com Ele, sabe que pode confiar nEle. E na Sua promessa.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

Baixe, leia e divulgue!


Amigos que me acompanham semanalmente, atendendo a solicitações de alguns de vocês, preparei um ebook com uma compilação de 366 textos escritos por mim nos últimos 14 anos. O resultado é um devocional com textos diários para reflexão. Acho que o resultado final ficou realmente muito bom, mas opinião de pai não serve, então preciso da sua opinião e de sua ajuda para divulgar o trabalho. 

"Instantâneos do Reino" está à disposição para venda aqui, basta clicar na capa do livro.

Espero que esse trabalho sirva para honra e glória de Deus e que de alguma forma ajude você a ter um ano fantástico ao lado dEle.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Jack Bauer e o bem maior


Durante as oito temporadas de 24 horas, série de TV americana estrelada por Kiefer Sutherland, vemos o agente Jack Bauer salvando a pátria ou a vida de milhões de pessoas em “tempo real”, ou seja, acompanhamos oito dias inteiros, de 24 horas, na vida desse personagem. Ele é um agente de uma unidade antiterrorismo e luta contra chineses, árabes, grupos paramilitares de ultradireita dos próprios Estados Unidos e outros inimigos, aparentes ou ocultos, enquanto precisa proteger a própria família. O reloginho digital que aparece de quando em quando mostra que o tempo está escoando e confere um ar de urgência e uma adrenalina difíceis de rivalizar na ficção contemporânea.

Mas há um outro aspecto da série que a torna um caso único: para conseguir seus fins, para alcançar seus nobres objetivos, Bauer não hesita em torturar. A tortura tem sido um tabu para a sociedade moderna. O mocinho pode matar à vontade, mas torturar não. A tortura é ultrapassar um limite vital. Mas no caso de Jack Bauer, para o grande público não há problemas nisso. Embora seja a primeira vez que o mocinho de uma série de TV lança mão de expedientes assim, está claro que ele está agindo por um bem maior. Sua ação está justificada. Além disso, vê-se que Bauer não é imune ao dilema ético envolvido na tortura; ele sofre, se angustia. O fato de ser um homem digno e de tentar ser um bom pai de família e esposo suavizam esse traço negro de sua personalidade.

A dúvida aqui é: um cristão estaria justificado por fazer o trabalho sujo por um bem maior? Há, enfim, fins que justificam alguns meios?

Penso que Deus tomou uma decisão análoga para nos liberar dela. Para que a raça humana sobrevivesse, Ele consentiu em entregar Seu Filho para ser torturado. Deus não tortura o outro, Ele Se deixa torturar para me fazer entender o quanto uma vida humana é sagrada e o quanto uma vida humana vale de fato. Ele faz isso com um respeito estrito à Lei. Ele critica as relativizações da Lei. “Pois quem obedece a toda a Lei, mas tropeça em apenas um ponto, torna-se culpado de quebrá-la inteiramente” (Tiago 2:10).

Existem momentos em que uma mentira esteja justificada? Mesmo que seja uma mentirinha? Será que em alguns momentos não estamos justificados por reter alguns impostos? Será mesmo que não existem situações em que precisamos de uma válvula de escape moral para conseguir manter nossa caminhada ascendente?

Não, é a resposta dEle. Ainda que você sofra. Ainda que alguém que você ama sofra. Melhor coisa é chorar e sofrer agora para estar longe do choro e do sofrimento eternamente.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

O que aprendo com fraldas



Estamos há duas semanas de volta ao magnífico mundo das fraldas, mamadas, choros e arrotos aqui em casa. Para alegria de minhas noites, o item “choros” é o menos frequente nessa lista e a ela podemos agregar uma paixão descomunal. Há algo de totalmente especial no afeto que se sente por uma criatura que ainda não interage com você e que depende de você pra absolutamente tudo, não por ela ser dependente e por não interagir, mas por ela ser carne de sua carne e sangue de seu sangue, com o que mais de metafísico esteja contido nesse fato.
E graças a estas palavras de Donna J. Habenicht (em “Como ajudar seu filho a amar Jesus”, Casa Publicadora Brasileira), não tenho mais pressa para chegar à fase em que ele interagirá comigo. Percebi que estes dias são igualmente importantes na formação do caráter de meu filho. Veja:
“Aprender a confiar é um estágio inicial no desenvolvimento da personalidade. Todo crescimento posterior da personalidade repousa sobre o fundamento da confiança. Um bebê que se desenvolve normalmente aprende a confiar durante o primeiro ano de vida, enquanto adultos amorosos lhe suprem as necessidades e o convencem de que o mundo é um bom lugar, onde ele pode confiar nos outros. Naturalmente, a criança pode desaprender a confiar mais tarde, se a vida lhe trouxer experiências cruéis, nas quais tenha que desconfiar a fim de sobreviver.
Aí é que entra amamentar, fazer arrotar, dar banho e trocar fraldas. Aprender as lições espirituais de amor e confiança envolve muito mais do que abraços e beijos, embora estes sejam importantes. Para um bebê, amor é ter alimento quando está com fome, conforto quando sente medo e agasalho quando está com frio.”
O que me conduz a uma interessante conclusão a respeito da natureza do sofrimento em minha vida. De fato, amor e confiança são coisas que temos ocasião de sentir quando aparecem a fome, o medo, o frio. Fome, medo e frio, uma lista exemplificativa, e não exaustiva, seriam oportunidades para aprender quem é confiável e para experimentar confiança. O nenê não se revolta porque chegou a sentir frio, ele se regozija porque o frio foi aplacado pela mãe e passa a confiar nela incondicionalmente. Assim, muito embora tenhamos a ilusão de querer poupar todo o sofrimento de nossos bebês, é justamente a aparição do sofrimento, da falta, que eles estão aprendendo o que há de mais importante na vida.
Quando algo faltar, amigo, saiba que é a ocasião em que você está sendo convidado a dar um passo vital em sua salvação eterna: confiar.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Não é brinquedo não


As páginas amarelas de Veja publicaram esta semana uma interessante entrevista com o jovem pastor norteamericano Rob Bell. Bell fundou a igreja Mars Hill, em Grand Rapids, que cresceu até se tornar uma das maiores congregações do país. Multimídia, ele aparece em uma série de vídeos de cerca de dez minutos em que faz pequenas e profundas pregações e também publicou diversos livros. Tudo isso fez dele um expoente do cristianismo e por isso mesmo foi grande a controvérsia quando, em seu último livro, defendeu a ideia de que não existe Céu nem inferno.

Na entrevista, Bell afirma que ninguém sabe o que acontece depois da morte, então deveríamos ter mais humildade com esse assunto. E ele tem razão, ao menos se aplicarmos à palavra “sabe” nessa frase o sentido científico de conhecimento empírico.

É no mínimo curioso notar que exista tanta divergência quanto à resposta a essa pergunta essencial do ser humano: “para onde vamos?” Mais curioso ainda é constatar que a esmagadora maioria das teorias a respeito contradizem frontalmente o que a Bíblia afirma. A Bíblia afirma que somos o encontro de um corpo, feito do barro pelo próprio Deus, e do fôlego de vida que Deus sopra (Gênesis 2:7). Assim, o corpo sem o fôlego não é “alma vivente”. O fôlego sem o corpo também não é “alma vivente”. Uma alma, segundo a Bíblia, é a conjugação desses dois fatores. As Escrituras vão mais além quando afirmam que os mortos não sabem coisa nenhuma, não têm consciência, não têm parte alguma em nada que acontece no mundo dos vivos (Eclesiastes 9). O próprio Jesus compara a morte a um sono. Ora, quem está dormindo não está acompanhando o que acontece, muito menos intervindo e tomando parte nas idas e vindas dos humanos vivos.

Quer dizer que ao morrer eu vou para a sepultura? Meu espírito desencarnado não vai pra algum lugar, melhor ou pior? É exatamente isso. Mas em I Tessalonicenses 5 Paulo afirma que não queria que ninguém ficasse em ignorância quanto ao que acontece “aos que dormem”. Ele afirma que quando Jesus voltar a essa Terra, soará o brado e então todos os que morreram “em Cristo” ressuscitarão, ou seja, o corpo reconstruído reencontrará o fôlego de vida e essas pessoas voltarão a viver, dessa vez eternamente ao lado de Jesus.

Rob Bell tem razão quando afirma que ninguém sabe (empiricamente) o que acontece após a morte, mas não tem razão de afirmar que não temos como saber. Paulo disse que ninguém deveria ser ignorante quanto a isso.

Mas a resposta da Bíblia a essa pergunta é tão impopular porque é muito mais confortante acreditar na mentira do “certamente não morrerás” dito pela serpente a Eva e repetido à exaustão pelos séculos afora. É um alívio pensar que vou ter infinitas oportunidades de ser alguém melhor. Se não der nessa vida, tento na outra, então posso pensar em “ser alguém melhor” mais pra frente.

Conhecer o que as Escrituras falam sobre a morte tem como primeiro efeito em nós nos confortar com a certeza do reencontro com nossos queridos que já foram, dormindo em Cristo. O segundo efeito é nos fazer entender que esta vida não é brinquedo. Com a vida não se brinca! Ela é a única bala da agulha, nossa única e final oportunidade de escolher a vida de verdade, a vida eterna.

Estamos sendo constantemente lembrados de que a qualquer momento nossa vida pode ser ceifada. Somos frágeis, somos vulneráveis. Se entendermos que com a vida não se brinca, não adiaremos mais a mais importante das decisões.

É o que lhe desejo hoje.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Canção para Pedro

Canção para Pedro
 
Sabe, Pedro
Desde cedo
Quando soube que você viria
Gastei horas pensando
No que lhe ensinaria
Nas coisas que você precisa saber
Sobre esta vida
E pra que você comece
Bemv
Queria que soubesse
Que
 
Sucesso é amar e ser amado
A paz é o dom supremo
Felicidade não se vende no mercado
Amizade muito menos
Nunca tenha preguiça
De fazer o que é certo
Mantenha sempre a família
E quem se ama por perto
Consuma diariamente
Água, Bíblia e salada
Evite determinadamente
O pecado, o rancor, mais nada
Nunca, por medo da sujeira
Evite uma amoreira
E tome sempre que der
Banho de cachoeira
Nunca faça a besteira
De ignorar um céu estrelado
E tudo que você quiser
Vá atrás, não fique parado
Consuma sem moderação
Livros, amizade e oração
E quando a solidão apertar
Confie em Deus e o mais ele fará
 
Sabe, Pedro
Desde cedo
Quando soube que estava a caminho
Gastei horas orando
Pedindo, implorando,
Pressenti que esse discurso
Pra ser assimilado totalmente
Requer mais que palavras
Mas uma vida coerente
E enquanto juntos temos tempo
Peço a Deus, me faça exemplo
Me faça feliz como ninguém
Pra você querer ser feliz também
Amém.
 

(Pedro nasceu às 09:35 de hoje, com 3,490 kg e tamanho ainda incerto, está ótimo e a mãe também. O pai está meio desidratado de tanto babar, mas a opinião geral é de que sobreviverá. Já se instalou uma saudável polêmica sobre quem ele puxou e estamos explodindo de gratidão a Deus. Rejubile-se conosco)

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Os crentes também amam


Há algumas semanas eu comentei aqui, partindo dos textos em que Paulo nos adverte a ter uma postura de tolerância, cuidado e paciência com os irmãos da igreja, que Deus tem um interesse curioso em manter pessoas fracas, erráticas, chatas e inconvenientes na igreja, para nossa edificação, e que não devemos tentar fugir delas. Bem, talvez tenha chegado o momento de dar um passo além.

Em João 8:35 Jesus dá o sinal distintivo da verdadeira igreja na Terra. Talvez você esteja mais afeito aos textos do Apocalipse que dizem que a verdadeira igreja é aquela que guarda os mandamentos e a fé de Jesus, mas quando Ele próprio quis destacar qual o elemento distintivo de Sua igreja verdadeira para as dos falsos profetas, Ele afirmou: “nisso conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”.

Nós gostamos de falar de amor nos meios cristãos. Falamos dele o tempo todo. Fiz uma breve pesquisa com o auxílio do site da Sociedade Bíblica do Brasil e vi que apenas o livro de Tiago não menciona a palavra amor nem uma vez no Novo Testamento. Com uma tal ênfase, é difícil fugir do tema. O curioso é que nossa forma de enfocar esse assunto é frequentemente de forma vaga, dirigindo o amor “às pessoas”. “Pessoas”, assim, essa coisa indeterminada, sem rosto e que de preferência está bem longe. Pessoas que sofrem como o homem que o bom samaritano encontrou no caminho e aí pode ser que a gente tope com alguém numa situação semelhante algum dia... Contudo, outra coisa que essa minha pesquisa pelo tema do amor no Novo Testamento me revelou é que essa palavra é empregada geralmente no contexto da própria igreja.

Jesus disse que se alguém andasse por uma rua que tem muitas igrejas e passasse olhando lá pra dentro, iria poder reconhecer a igreja verdadeira pelo grau de afeição e amor que os membros dessa igreja têm uns pelos outros. Uns pelos outros primeiro, e só depois pelas “pessoas”, aquelas sem rosto que a gente pode um dia, talvez, encontrar (mas que tomara que não encontre).

Quando introduz sua brilhante ilustração da igreja como um corpo, Paulo afirma que a coisa funciona num tal nível de organicidade amorosa que “se um membro padece, todos os membros padecem com ele; e, se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele” (I Coríntios 12:26), e aí a gente pensa na nossa igreja e vê que ela não funciona assim. Na minha igreja muitas vezes quando alguém sofre os demais parecem agir como se ficassem aliviados porque não aconteceu com eles e às vezes até assumem um ar superior que emula a ideologia teológica dos amigos de Jó. Na minha igreja, na maioria das vezes que alguém tem uma grande vitória – um emprego novo, uma boa promoção, a compra de uma boa casa, a assunção de um posto honrado, etc – essa pessoa vai ter que comemorar sozinha, porque os demais parecem sentir uma impossibilidade absoluta de ficar feliz por ela.

Penso que quando Paulo afirmou que a igreja seria o palco onde você seria chamado a exercitar paciência, tolerância e o dom de direção e advertência, falando em outros cantos que o tipo de sentimento que deveria imperar na igreja seria o amor, ele indicava que os fracos, aqueles que invejam e não amam, seriam a exceção, e não a regra.

Existe essa peculiaridade irritante do amor: ele é princípio. Ele não espera o outro ser amável para amar. Ele não espera sentir amor para agir como se amasse. Você decide amar as pessoas que o rodeiam em sua igreja. No resto Ele age.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

A diferença


Talvez a diferença entre o cristão e o mundo resida menos em ele fazer ou não fazer certas coisas que o mundo faz, usar ou não usar certas coisas que o mundo usa, e mais na relação que o cristão tem com essas coisas. É claro, há coisas que o mundo faz e usa de que o cristão se abstém em absoluto, mas há uma distinção radical, inda que sutil, entre o cristão e o mundo, uma distinção que é de outra natureza.
 Veja este intrigante texto de Paulo, achado no meio do ainda mais intrigante capítulo 7 de I Coríntios: “Irmãos, a coisa importante é lembrar que o tempo que ainda nos resta é muito curto. Por esta razão, aqueles que têm esposa devem viver como se não tivessem. Os que choram, como se não estivessem chorando; os que estão felizes, como se não estivessem; os que compram, como se não fosse deles o que compraram; os que tratam de coisas deste mundo, como se não estivessem ocupados com elas. Porque o mundo, em sua forma atual, bem depressa se acabará” (Bíblia Viva).
 Comentando este texto, o alemão Dietrich Bonhoeffer diz: “Tal é a vida da igreja no mundo. Cristãos vivem como outros homens: eles se casam, choram e se alegram, eles compram coisas e usam o mundo em sua existência cotidiana. Mas eles têm tudo através de Cristo apenas, nele e por causa dele. Assim, eles não estão ligados a isso. Eles possuem tudo como se não possuíssem. Eles não enterram seu coração em suas posses, mas são intimamente livres. É por isso que são capazes de usar o mundo sem ser retirados dele (I Coríntios 5:13). E é por isso também que eles podem deixar o mundo quando ele se torna um impeditivo ao discipulado... Eles vendem e se lançam no comércio, mas apenas tanto quanto suas necessidades cotidianas o exigem. Eles não acumulam tesouros e põem neles seu coração. Eles trabalham, porque não lhes é permitido permanecer ociosos. Mas seu trabalho não é, decerto, um fim em si mesmo. O trabalho pelo trabalho é uma noção alheia ao Novo Testamento”.
 Talvez mesmo a diferença fulcral entre o cristão e o mundo resida na forma como ele lida com o casamento, o trabalho, o comércio, as alegrias e tristezas da vida. Para ele, nenhuma dessas coisas é um fim. O casamento não é o que determina o “e foram felizes para sempre”, embora seja uma parte importante do cenário geral da vida; o sucesso no trabalho ou o dinheiro que dele advém não são o que determina o valor do cristão como pessoa – seu valor é encontrado na cruz de Cristo. Assim, o cristão não trabalha e não negocia para vencer o outro ou para se impor, o que determina em que ele utilizará um ferramentário e uma ética completamente diferentes dos que o mundo utiliza. E a alegria e a tristeza que aparecem no caminho do cristão, ele sabe, não são o fim e vão se alternar nesta vida enquanto estivermos no mundo. O cristão não se apega a um ou outro para encontrar o sentido da vida, porque sua vida já tem um sentido muito mais elevado, calcado na certeza do livramento alcançado na cruz e na esperança da vitória definitiva que é de Cristo e que está à frente, por mais um pouco de tempo (“o tempo que ainda nos resta é muito curto”!). Por isso o cristão não se desespera quando aquela alegria passa e não se ilude com a tristeza passa.
 A que você se apega de fato, @migo? À cruz de Cristo ou a algo transitório que o mundo sobrevaloriza? Apegue-se à cruz e tudo o mais vai encontrar seu devido lugar dentro de seu coração.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Até os malas


“Exortamo-vos também, irmãos, a que admoesteis os insubordinados, consoleis os desanimados, ampareis os fracos e sejais longânimos para com todos” (I Tessalonicenses 5:14). Essas palavras dirigidas por Paulo à igreja revelam uma verdade para muitos indigesta.
 Veja, Paulo está afirmando que a igreja deve ser um ambiente em que você esteja disposto a exercitar sua capacidade de admoestação, ou seja, de exortação, de direcionamento, de ensino, de correção de condutas equivocadas. Está conclamando você a exercitar na igreja suas habilidades consoladoras aos desanimados e que ampare os fracos. Ele afirma ainda que lá é o local onde devemos ser longânimos para com todos. Todos!
 A forma como esse verso aparece na Bíblia Viva é ainda mais eloquente: “Irmãos, admoestem aqueles que são preguiçosos ou rebeldes; confortem aqueles que estão atemorizados; tenham um carinhoso cuidado por aqueles que são fracos; e tenham paciência com todos”.
 A verdade indigesta escondida aqui é bastante simples: a igreja deve ser um lugar para gente preguiçosa, rebelde, amedrontada, fraca e (sim!) chata. Chata, porque com quem mais você deveria exercitar a paciência?
 Sei que você tinha vontade de promover uma limpeza emulando os esforços de eugenia nazista, tirando da sua igreja os chatos, os inconvenientes, os que falam na hora errada, os que se vestem de forma bizarra, os que vivem se lamuriando e os que não querem nada com nada, mas aí com quem você exercitaria a paciência, a consolação, a admoestação e essas coisas todas?
 O fato é que Deus quer que a igreja seja esse lugar heterogêneo, com uma multiplicidade de tipos gigantesca, em que nem todos demonstrem afinidades óbvias com você, e que, por alguma razão nem tão óbvia assim, Ele não quer você fugindo dessas pessoas, mas se relacionando com elas! Ele tem propósitos mais altos que passam pelo exercício da capacidade de aturar pessoas diferentes.
 Oswald Chambers coloca assim: “Na vida espiritual, cuidado para não andar de acordo com suas afinidades naturais. Todos têm afinidades naturais; de algumas pessoas nós gostamos, de outras não. Nunca podemos permitir que esse gostar ou desgostar governe nossa vida cristã. Se andarmos na luz como Deus na luz está, Ele nos dará comunhão com pessoas com quem não temos nenhuma afinidade natural”.
 É indigesto? Talvez sim, a princípio, como para muitos uma salada parece mais difícil de encarar do que uma pizza, mas expor-se à salada consistentemente acaba revelando alegrias insuspeitadas e com esse esforço para estar entre os chatos, preguiçosos, fracos e desanimados não há de ser diferente.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Os miseráveis

Estes textos que desde o longínquo ano de 1998 eu envio às sextas-feiras têm ao menos uma leitora fiel: minha mãe. Durante muito tempo ela criou o hábito de repassá-los a amigos e de imprimi-los. Com a corujice peculiar das mães, ela chegou a convencer um vizinho a ler a pilha de textos que ela guarda numa pastinha e depois me contou do feedback que recebeu dele, um católico fervoroso. Ele afirmou ter ficado encantado com boa parte dos textos, com uma ressalva: “mas a outra metade”, ele disse, “fala sobre essa coisa de graça de que tanto vocês falam e que eu absolutamente não entendo”. Talvez o consolasse saber que o autor dos textos, mesmo voltando tanto ao tema, também não entende “essa coisa de graça”, porque ela insiste em contrariar a lógica e o bom senso.

E não estamos sozinhos. A graça soa violenta a milhões de pessoas. Veja o exemplo de Javert, o policial obcecado por capturar o fugitivo Jean Valjean no clássico “Os miseráveis”, de Victor Hugo. Jean Valjean é um homem de força descomunal que foge da prisão antes de ser degredado. Na rota de fuga ele rouba um menino e se asila em uma igreja. O velho padre o acolhe, lhe dá comida e uma cama quente e Valjean responde roubando a prataria da igreja. Ele é capturado e levado de volta ao padre que o repreende por não ter levado também alguns castiçais. Ele afirma aos policiais que aquela prataria era um presente a Valjean que, dessa forma, é liberto. A graça contida naquele ato transforma Valjean radicalmente e dali por diante ele se torna um anjo para muitas pessoas. Em resumo, o favor imerecido e injusto mesmo obtido daquele padre fez Valjean ser confrontado abruptamente com sua condição de miserável moral e esse foi o estopim que determinou sua nova devoção a minorar o sofrimento de outros tantos miseráveis.

Durante anos Javert o persegue, porque tem um apego doentio ao império da lei. Não importa as evidências de redenção moral dadas por Valjean, ele continua sendo um foragido e seu lugar é nas colônias penais francesas espalhadas pelos infernos tropicais. A hipótese de seus crimes passados ficarem sem a punição prescrita na lei lhe parece hedionda. Mas estoura a Revolução e numa grande reviravolta Javert se vê preso pelo tribunal do povo, acusado de ser um espião a serviço da monarquia. Valjean se apresenta então para ser o carrasco executor da pena de morte sobre Javert, mas em lugar de o fazer, quando está longe das vistas dos outros simplesmente liberta Javert e se entrega para ser preso. Javert então sente que é impossível prender Valjean e o deixa ir, mas essa hipótese também lhe parece inaceitável. Incapaz de lidar com o binômio lei x graça, Javert se suicida.

E, no entanto, é exatamente este o procedimento da graça: ela encolhe a mão da justa punição e deixa ir livre o infrator, apontando para a punição injusta que Jesus sofreu em seu lugar. Ela age como se o mensalão fosse julgado por ex-detentos políticos, aprisionados injustamente na ditadura militar, que considerassem os réus culpados de corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, mas comutassem a pena afirmando que a pena injusta que eles, os magistrados, cumpriram, é considerada em favor dos réus, deixando-os, portanto, livres. Ficaríamos indignados com um desfecho assim, não é? É difícil entender a graça.

E muitas vezes é ainda mais difícil aceitar a graça e permitir que ela nos transforme. Isso implicaria em reconhecer que somos nós os miseráveis... Se você aceitar a ilógica da graça, amigo, ela o tornará um multiplicador da graça por onde você passar, não há outro caminho. Só que antes você precisa confessar: “eu sou um miserável”!

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Vitória!


Essa palavrinha aparece com insistência no Novo Testamento. Ali eu leio que em Cristo somos “mais que vencedores” (ou, como diz a Bíblia Viva, “temos uma vitória esmagadora” Romanos 8:37). Uma página adiante Paulo aconselha a não deixarmos que o mal vença: “mas vence o mal com o bem” (Romanos 12:21). Em Hebreus 11 são enaltecidos os que “venceram reinos...” (verso 33) e em I João os jovens são aplaudidos por haverem “vencido o maligno” (2:13). Em Apocalipse 2 e 3 há promessas fantásticas destinadas “ao que vencer” e no finalzinho do livro é reafirmado que “quem vencer herdará todas as coisas, e eu serei seu Deus, e ele será meu filho” (21:7).

Essa repetição do tema da vitória me faz tirar pelo menos duas conclusões simples: 1) não é legítimo esperar, deste lado da eternidade, uma vida sem conflitos. Somos incentivados a buscar a vitória porque há um combate em andamento, precisamos tomar um lado e lutar. Para alguns a luta será contra o relógio, fabricando tempo para focar no que mais importa, sua relação com Deus e o cuidado com aqueles a quem Ele os confiou. Para outros a luta será contra o paladar, contra o refrigerante, o excesso de açúcar e fritura ou contra a balança, contra o terceiro e quarto pedaços de pizza ou a carne. Para outros a luta será contra a pornografia, a dependência sexual, os hábitos mentais já estabelecidos há longa data, ou quem sabe contra as práticas desonestas que configuram seu ganha-pão e há aqueles que terão mais do que uma só luta. Não importa qual seja a luta, é preciso escolher o seu lado e lutar; 2) se Cristo acenou para mim com promessas magníficas colocando como condição a vitória é porque a vitória é possível, é plausível, é factível. Especialmente porque “em Deus alcançaremos a vitória” (Salmo 108:13), “do Senhor vem a vitória” (Provérbios 21:31), “é ele quem nos faz vitoriosos por meio de Jesus Cristo, nosso Senhor” (I Coríntios 15:57) e é “Deus quem opera em vós o querer e o efetuar” (Filipenses 2:13), assim, quando você estiver lutando, será com a força de Jesus Cristo, o vitorioso, que você estará lutando, e não com seus parcos, limitados e falhos recursos. E, se assim é, não haverá desculpa ou justificativa que "cole" para haver fracassado.

O Céu não é dos tímidos, amigo (Apocalipse 21:8). É dos vencedores. E, se você ouviu este discurso, é porque está sendo chamado e habilitado a vencer. Vai virar para o lado e fingir que não entendeu?

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

O miolo


A comparação do número de divórcios entre casais cristãos e não cristãos é bem reveladora: é exatamente igual. Isso parece indicar que a religião não parece ter qualquer impacto maior sobre o relacionamento horizontal mais importante que existe, já que se mostra incapaz de fazê-lo perene (como ela prega que deve ser).

Também de quando em vez cai-me nos ouvidos histórias estranhas sobre irmãos de igreja. Práticas sexuais absurdas, envolvimento com tráfico de drogas, desonestidade nos negócios.

E há momentos em que me pego escandalizado pelo fato de encontrar nos meus irmãos de igreja práticas mais sutilmente hediondas, como inveja, má fé, maledicência, injustiça, cobiça, orgulho, vaidade e ganância.

Estou na igreja há muito tempo e há muito tempo escuto dizer que o cristão tem que ser diferente do “mundo”. Não podemos nos “conformar com o presente século”, não podemos entrar na mesma fôrma, temos que ser a luz do mundo e o sal da terra. O problema é que esse discurso vem costumeiramente acompanhado de um chamado a não usar o cabelo deste ou daquele jeito, a não usar esta ou aquela roupa, a não usar este ou aquele adorno e a não ouvir esta ou aquela música. Esse discurso, portanto, é direcionado para a casca mais exterior.

Romanos 8:19 diz que “toda a criação espera com expectativa que os filhos de Deus sejam revelados”(BV). Malaquias 3:18 afirma que vai chegar um dia em que “vereis a diferença entre o justo e o ímpio, entre o que serve a Deus e o que não o serve”. Eu não preciso quebrar muito a cabeça para concluir que a revelação dos filhos de Deus e a exibição da diferença entre estes e os ímpios não reside na casca, mas no miolo, no interior: “Nisto conhecerão que sois meus discípulos”, afirma Jesus, “se vos amardes uns aos outros” (João 13:35).

O amor, amigos, e II Coríntios 13 não me deixa mentir, é totalmente incompatível com relacionamentos negligenciados, com o manejo leviano do sexo, com a apreciação da pornografia, com a ganância, o orgulho, a má fé, a inveja, a maledicência e todas aquelas coisas que já mencionei. Ele tem muito menos a ver com o corte de cabelo e o estilo musical que eu escuto, embora esses possam influenciar indiretamente naqueles.

Precisamos mirar nossos canhões no cerne da questão. Queremos parecer diferentes do mundo? Não há outra saída: precisamos ser diferentes antes. Caso contrário jamais a igreja causará impacto. Jamais olharão para nós admirados por havermos estado com Cristo. E, para ser diferentes não há outra fórmula além da que já está lançada: “Quando alguém está em Cristo, torna-se uma pessoa totalmente nova por dentro. Já não é mais a mesma pessoa. As coisas antigas já passaram e teve início uma nova vida!” (II Coríntios 5:17, Bíblia Viva).

P.S.: Hoje é dia das crianças, aquela coisa que se alguém não se tornar como ela, não verá o reino de Deus. Bem, uma coisa que uma criança não é, é dissimulada. O que ela parece ela é. Precisamos aprender com elas!

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Mananciais


Jesus Cristo, que gosta muito de um paradoxo, diz que aquilo de que você mais precisa está à sua disposição, mas apenas se você não o mantiver consigo.

Para a sedenta mulher samaritana junto ao poço, Ele disse: porque a água que eu dou se tornará dentro de todos uma fonte a jorrar para a vida eterna. E, em Jerusalém, afirmou em alto e bom som à sedenta multidão: porque as Escrituras declaram que rios de água viva correrão do íntimo de todo aquele que crer em mim, fazendo referência a Isaías 41:18: farei nascer rios no alto das montanhas, farei surgir fontes no fundo dos vales! No deserto haverá açudes e na terra mais seca brotarão mananciais! Ele promete, portanto, transformar você em uma fonte, e não em um lago pitoresco.

“Você precisa de água? Ok, vou fazer com que brote uma fonte dentro de você.” É como se Jesus não estivesse dizendo “você precisa de mim, então vou fazer você ficar pleno e repleto de mim”, mas “você precisa de mim, então vou fazer você dar de mim para os outros”. 

A fonte não sabe nada sobre os campos irrigados por suas águas e assim é com todo aquele que mata sua sede em Jesus Cristo. Dele sai vida que transforma radicalmente a paisagem de desertos longínquos. Centenas de pessoas são beneficiadas pela água que você bebeu pretendendo matar a sua sede. Pessoas que talvez você nem venha a conhecer – pessoas que cruzam o caminho de pessoas que antes cruzaram o seu caminho, pessoas que estiveram sob sua raia de influência por um breve período há muito tempo, apenas, seus bisnetos e tataranetos, não sei.

Se assim é, a igreja seria, portanto, o encontro de muitas fontes, todas comunicando água umas para as outras. Que visão diferente daquela que temos, de um povo sedento recebendo as águas que fluem em mão única a partir do púlpito!

Há uma série de condições para a pureza da água que brota da sua fonte. Posso listar duas delas: você precisa estar ligado à Fonte maior e você precisa estar comunicando vida a outros. Caso você desligue sua relação com a Fonte da água viva e caso você decida represar a água que dela recebeu, sua fonte se torna amarga e imprestável.

Você tem sede, amigo. Seja um manancial!

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

Extraordinários


Toda época de eleições eu passo pela multidão de banners, cavaletes e placas com rostos de candidatos e sou assaltado por reflexões quanto à lógica da democracia. Já era assim quando morava em São Paulo, mas agora que moro numa cidade pequena o meu estranhamento fica ainda mais evidente. Em minha cidade, temos opções fantásticas concorrendo ao posto de vereador. Candidatos como Dejair Canibal, Sangue Bom, Tio João, Zé do Lava Rápido e Nice Carteira. São apenas exemplos extremos do esforço enorme que os candidatos fazem para ganhar identificação com o eleitor. Todo candidato quer parecer ser alguém do povo, alguém como você e eu.

E, no entanto, se pensarmos que a classe política é que vai, representando e em nome desse povo, definir seu destino na produção de leis que terão impacto direto no dia-a-dia de cada um, e que eles serão peça fundamental da aplicação dos recursos recolhidos com os impostos que todos pagam, o mais sensato seria esperar que o povo votasse nos melhores, naqueles acima da média, nos que vão além da mediocridade, seja em termos éticos, seja em termos de capacidade intelectual.

Jesus Cristo fez um grande (para nós, um gigantescamente incompreensível) esforço para se parecer comigo e com você. Ele tomou nossa forma, comeu nossa comida, suou nosso suor, sofreu as nossas dores. Mas ainda assim foi acima da média em tudo. Ele mostrou deter um conjunto de valores superior ao de qualquer outro do povo, e o mesmo com relação ao seu discernimento e com relação à coerência entre teoria e prática. Ele é Quem é porque é parecido comigo, mas faz muito mais e melhor do que eu faço. E o melhor: me chama a imitá-lo nisso também!

Quando leio: Se vocês amam somente aqueles que os amam, por que esperam que Deus lhes dê alguma recompensa? Até os cobradores de impostos amam as pessoas que os amam! Se vocês falam somente com os seus amigos, o que é que estão fazendo de mais? Até os pagãos fazem isso! (Mateus 5:46 e 47), estou lendo o chamado a não me contentar com a mediocridade, não me contentar com o padrão reinante. Ele diz: “isso qualquer um faz. Eu espero mais de você!”

Jesus nos chama para ser extraordinários. Para ter uma pretensão mais alta. Para ter um objetivo mais ambicioso. Jesus nos tira da zona de conforto e aponta para cima, onde Ele próprio está. 

sexta-feira, 21 de setembro de 2012

Tratado de tolerância


Em meio à cadeia infindável de tumultos ocasionados pelo filmeco caseiro americano anti-islâmico e às charges de Maomé publicadas na França, um interessante debate sobre os limites da liberdade de expressão se levantou no Ocidente. Devemos ofender declaradamente apenas para reafirmar nossa liberdade de poder fazê-lo? Agir de outra forma seria capitular à barbárie absolutista do fundamentalismo islâmico? E as vidas que foram e serão ceifadas pela fúria islâmica, não são um preço alto demais a pagar por esse valor principiológico da liberdade?

A reação mais diplomática do mundo islâmico foi o anúncio de que tentarão inscrever a blasfêmia como um crime nos Tratados Internacionais do gênero para, assim, conseguir uma ferramenta legal de repressão a expressões que os mais exacerbados muçulmanos reputam como ofensivas.

Este seria um caminho bastante perigoso, contudo, ao menos para uma importante parcela de muçulmanos ao redor do mundo. Reconhecer os axiomas desta ou daquela religião como sendo aplicáveis e oponíveis universalmente poderia desencadear um regime de reciprocidade altamente desvantajoso para o mundo muçulmano, já que é possível exercer essa fé com relativa tranquilidade em praticamente todos os países em que a maioria professa outra religião, mas a recíproca não é verdadeira. Assim, já que o Ocidente teria que entender ser um crime fazer uma caricatura de Maomé, estaria, por outro lado, liberado para proscrever a religião muçulmana como o cristianismo o é em diversos países islâmicos. É dizer mais ou menos o seguinte: você quer que eu engula esse preceito que você diz ser essencial na sua fé mas você não tolera o preceito essencial de liberdade da minha; nesse caso, você não faz jus à liberdade também.

Atrair a religião ao Estado, dar ferramentas de repressão legal por motivos religiosos, poderia dar ensejo a uma espiral de intolerância que colocaria em risco o processo de globalização ou, estressando ao máximo a situação, a própria vida como a conhecemos. E, no entanto, nossa Bíblia avisa que é exatamente um estado de coisas assim que será instaurado brevemente.

Para nós, que não saímos por aí ofendendo o Profeta mas que também custamos a entender a fúria que move as multidões ofendidas, esses eventos nos ajudam a lembrar de um princípio essencial: tolerância exige tolerância. Se você quer que as excentricidades de sua fé sejam toleradas pelos outros, precisa tolerar as bizarrices deles também. Não devemos ter medo de pensar assim, porque “a sabedoria deste mundo é loucura diante de Deus” (I Coríntios 3:19), assim, nada mais natural que os sábios deste mundo nos vejam como excêntricos. Não é, contudo, agindo como se a nossa excentricidade fosse superior às dos demais que o evangelho da salvação será pregado. Jesus não forçou nenhuma porta, ao contrário, bateu suavemente em cada uma torcendo para ela ser aberta por dentro.

O cristão é um multiplicador de tolerância e compreensão. Missão cada vez mais complicada de se desempenhar, mas quem disse que seria fácil?

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Impossível


I.
Se pensarmos na palavra “impossível” na Bíblia lembraremos provavelmente da assertiva de Jesus de que para Deus nada é impossível. Mas essa palavra aparece em um outro texto que por anos tem colocado uma pulga atrás de minha orelha: “É impossível que os que já uma vez foram iluminados, e provaram o dom celestial, e se fizeram participantes do Espírito Santo, e provaram a boa palavra de Deus, e os poderes do mundo vindouro, e depois caíram, sejam outra vez renovados para arrependimento, porque de novo estão crucificando para si mesmos o Filho de Deus, e expondo-o ao vitupério” (Hebreus 6:4-6).

Estamos afeitos ao “Deus da segunda chance”, mas este trecho – um texto tão obscuro que sequer aparece na minha concordância bíblica ao lado do verbete “impossível” - diz que há um perigo no horizonte para os que estão perto dEle. Ele diz que, para uma classe de pessoas, cair agora é selar seu destino.

Eu procurei não alimentar minha pulga para que ela não ficasse tão gorda, até que, esses dias, tropecei neste parágrafo de Dietrich Bonhoefer, a respeito do trecho do Sermão do Monte em que Jesus diz que somos o sal da terra: “... O sal pode perder seu sabor e deixar de ser sal. Ele simplesmente para de funcionar. Então ele é realmente inútil, só serve para ser jogado fora. Essa é uma peculiaridade do sal. Tudo o mais precisa ser temperado com sal, mas uma vez que o próprio sal perde seu sabor, ele não pode nunca ser salgado de novo. Tudo o mais pode ser salvo pelo sal, não importa quão mau seja – apenas o sal que perde seu sabor não tem esperança de recuperação. Esse é outro lado da figura. É o julgamento que impende sobre a comunidade de discípulos, cuja missão é salvar o mundo mas que, se cessar de viver para essa missão, estará irremediavelmente perdido. O chamado de Jesus Cristo significa que ou somos o sal da terra ou estamos aniquilados; ou atendemos ao chamado, ou somos jogados na rua e pisados. Não há segunda chance aqui.”

II.
Tatiana e eu nos participamos e lideramos grupos de estudo da Bíblia para casais. É curioso ver a reação de quase todos que participam desses grupos ou de retiros para casais. Geralmente os homens vão para coisas assim meio arrastados, mas depois de algum tempo revelam com surpresa que foi uma das melhores coisas que lhes aconteceu. Iniciativas como essa lhes dão a oportunidade de desligar o resto do mundo e focar em dos relacionamentos mais importantes da vida, seguramente o mais importante entre humanos. Quando os casais param tudo para focarem sua atenção um no outro é como se a chuva caísse sobre a terra depois de uma estiagem enorme. A vida brota. As velhas promessas e intenções são reavivadas.

Ellen White, que gostava muito de jardinagem, emprega essa imagem frequentemente: relacionamentos são como plantas. Precisam ser regados. Os mais importantes com maior profusão, ainda que à custa de muita coisa importante. O que é essencial é maior do que o que é apenas importante.

III.
Impossível é uma palavra muito, muito forte. Ela não tem apelação, não tem jeitinho que abra uma brecha.

Talvez a pulga atrás de minha orelha por causa do texto de Hebreus continue ali. Reluto em tirar uma conclusão definitiva sobre o que exatamente esse texto quer dizer, mas sei bem qual é o efeito que ele tem sobre mim: o de me exortar a vigiar. O de me exortar a regar o relacionamento mais essencial de todos, aquele que eu tenho com Deus. Se eu um dia deixá-lo em ponto morto, deixar que ele caia na vala da mesmice e da rotina automática, se eu não dialogar com o Espírito Santo respondendo aos seus apelos, estarei na rota da destruição. Um dia eu vou acordar e nada mais disso tudo vai fazer sentido. Se isso acontecer comigo, minha salvação terá sido jogada no vaso sanitário.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Vida e morte, Marina

Eu vim para que tenham vida.
João 10:10

Vasculhando meus papéis encontrei algo que escrevi no final de setembro de 2.001, no meio do caos que se instalou no mundo com o atentado às Torres Gêmeas do World Trade Center, em 11/09 daquele ano. A mensagem, entendo, continua válida. Segue, pois, tal como o escrevi então:

“Já vamos para duas semanas em que não se fala de outra coisa. Parece que para todo lado que eu olho vejo fumaça, poeira, explosões, sangue, pavor, ou então homens de turbante brandindo metralhadoras, homens de terno com aspecto grave falando apressada e energicamente aos microfones.

Já vamos para duas semanas em que velhos ódios, guardados com algum cuidado em caixinhas nas gavetas de meias, são tirados para fora sem pudor e com a força que têm as coisas fermentadas na surdina durante muito tempo. Velhos desprezos reciclados.

Velhos preconceitos reeditados, renovados, reforçados.

Fala-se de guerra, fala-se de perseguição, novos atentados. Ninguém se sente absolutamente seguro, pois o inimigo pode bem morar ao lado, sorrir pra você de manhã, mas no recôndito de sua consciência alimentar ideias assassinas.

E do meio desse monte de poeira, sangue, lágrimas e medo, eu comecei a ouvir um choro. Mas é um tipo de choro bom, choro feliz. Foi com este e-mail:

"Fazendo jus ao lugar que vocês ocupam em nossos corações, estamos lhes avisando em primeira mão do nascimento de Marina Cestari Menegusso, hoje às 18:30, com 3,410Kg e 50cm, no Hospital Adventista de São Paulo. Conforme esperado, ela é linda (puxou o joelho da mãe), desinibida (nasceu peladinha), sociável (chora pra todos indistintamente), inteligente (já aprendeu a mamar) e logo mais estará resolvendo os problemas do mundo."

A alegria de pai novo do meu amigo Paulo foi um lembrete importante pra mim. É que no meio da desgraça e da tragédia a gente tende a começar a achar que a morte é a regra. Que a morte é natural. O choro da Marina, que eu só imaginei, não me deixou esquecer que no Universo de Deus, VIDA é a regra e morte é a excrecência, a exceção maldita que inventamos. No meio da realidade pensada por Deus, morte é um vírus, só existe espaço pra vida. A Marina foi quem veio e me disse: a morte não estava no programa. Morte, você é muito chata, mas seus dias estão contados!

Pode ser que essa menina não resolva os problemas do mundo, Paulo, mas começou bem.“

Faça uma força para ouvir e fique do lado da regra, não da exceção.