quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

De perdão e de fardos

“Filhinhos, eu vos escrevo porque os vossos pecados são perdoados por amor do seu nome”.
I João 2:12

No filme A Missão, de Rolland Joffé, o personagem interpretado por Robert de Niro aceita participar de uma missão jesuíta no alto da Foz do Iguaçu, entre os índios hostis, para penitenciar-se por haver matado o próprio irmão. O trajeto todo até o local da missão ele sobe carregando um enorme fardo com peças de ferro amarrado a sua cintura. Um dos padres pensa que ele já sofreu bastante, então pega uma faca, corta a corda e empurra o fardo penhasco abaixo. Sem falar palavra, de Niro desce tudo de novo, amarra outra vez o fardo a si e recomeça a subida. A ética que o condicionava era: quanto mais ele sofresse, mais chances teria de obter o perdão divino.

Lutero, fruto da mesma ética, partilhou dessa idéia durante boa parte de sua vida. Foi subindo altas escadarias de joelhos que lhe ocorreu a idéia singela de que Jesus Cristo havia sofrido um sacrifício perfeito, que nenhum sofrimento seu poderia aperfeiçoar ou melhorar o dEle. Foi ali que ele percebeu que o perdão era dele se tão somente cresse.

Quanta gente, contudo, por desconhecer a extensão do sacrifício de Cristo, continua a penitenciar-se de mil maneiras diferentes por não conseguir se perdoar!

Certa vez, nos conta Mateus (Mateus 12:22 a 32), Jesus estava sendo contestado por fariseus, impressionados pelo fato dEle expulsar demônios. Em sua teologia de ocasião, afirmavam que Jesus era o chefe dos demônios, já que eles O obedeciam. A resposta de Cristo foi fantástica: “Todo pecado e blasfêmia se perdoará aos homens; mas a blasfêmia contra o Espírito não será perdoada. Se alguém disser alguma palavra contra o Filho do Homem, isso lhe será perdoado; mas se alguém falar contra o Espírito Santo, não lhe será perdoado nem neste mundo nem no vindouro” (versos 31 e 32).

Ora, se até as pessoas que, presenciando um milagre de Jesus, chamavam-nO de chefe dos demônios poderiam receber o perdão de Deus, então por que você e eu não podemos ser perdoados também? Por que continuamos levando a culpa pelos nossos erros, pelas besteiras que fizemos?

É mais que hora de lançar fora esse peso e erguer a cabeça, o sangue de Jesus já pagou o preço, nossa redenção se aproxima! Ele já levou o fardo, querer carregá-lo outra vez é menosprezar tudo o que fez por nós. Aceite o perdão, respire fundo e viva!

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

O mesmo espírito

Ela não podia crer no que estava acontecendo. Os cabelos soltos, descalça, vestida às pressas, sendo conduzida aos empurrões por entre uma multidão. Pela mente dela um turbilhão de pensamentos desencontrados oscilando entre a máxima vergonha e a angústia de estar prestes a se despedir da vida. Quando finalmente param de empurrá-la e de gritar aqueles impropérios todos, ela se joga ao chão tentando esconder o rosto com os cabelos, mas eles a agarram com violência pelo braço e a fazem ficar de pé, de um jeito que todos possam vê-la. Nesse momento ela ouve aquilo que já estava esperando - e temendo. O mesmo que a tomou pelo braço diz:

- Mestre, esta mulher foi surpreendida em ato de adultério. Na Lei, Moisés nos ordena apedrejar tais mulheres. E o senhor, o que diz? (Jo. 8:4 e 5)

A Lei à qual ele fazia menção é Levítico 20:10: "se um homem cometer adultério com a mulher de outro homem, com a mulher do seu próximo, tanto o adúltero quanto a adúltera terão que ser executados". No entanto, só se via a adúltera por ali. Muito embora houvesse isso que hoje chamaríamos de uma "brecha jurídica", a atitude do jovem mestre em quem fora depositado o destino daquela mulher foi surpreendente.
Escrever na areia, aparentando alheamento. Foi necessário que repetissem a pergunta para ele vaticinar seu famoso "quem estiver sem pecado que atire a primeira pedra".

A ideia era muito boa: Jesus estava sempre relativizando o rigor da Lei de Moisés como eles a entendiam, curando aos sábados e se misturando com gente que estava à margem da sociedade, então eles o forçariam a rebelar-se claramente contra a Lei e teriam aí o mote que precisavam para destruí-lo.

O engraçado é que Jesus não defendia uma desnecessidade de obedecer a Lei; ao contrário, Sua ideia de obediência era milhares de vezes mais rigorosa do que a deles, porque Ele dizia que o mero ódio já é homicídio, o mero desejo acalentado já é adulterio.

Aquela mulher merecia morrer. Ela era realmente uma pecadora. Jesus só pediu que a pena fosse executada por alguém em situação moral superior à dela, porque toda vez que julgamos alguém é isso que estamos fazendo, nos colocando numa posição de superioridade. E ali só havia uma única pessoa nessa situação, a pessoa que ao fim disse: "eu também não te condeno".

Não é fácil imitar Jesus. Ser intransigente com o espírito da Lei, não realizar uma única concessão ao pecado e, no entanto, abster-se de condenar quem assim não procede.

"Haja em nós aquele mesmo espírito que houve em Cristo Jesus".