sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Não é brinquedo não


As páginas amarelas de Veja publicaram esta semana uma interessante entrevista com o jovem pastor norteamericano Rob Bell. Bell fundou a igreja Mars Hill, em Grand Rapids, que cresceu até se tornar uma das maiores congregações do país. Multimídia, ele aparece em uma série de vídeos de cerca de dez minutos em que faz pequenas e profundas pregações e também publicou diversos livros. Tudo isso fez dele um expoente do cristianismo e por isso mesmo foi grande a controvérsia quando, em seu último livro, defendeu a ideia de que não existe Céu nem inferno.

Na entrevista, Bell afirma que ninguém sabe o que acontece depois da morte, então deveríamos ter mais humildade com esse assunto. E ele tem razão, ao menos se aplicarmos à palavra “sabe” nessa frase o sentido científico de conhecimento empírico.

É no mínimo curioso notar que exista tanta divergência quanto à resposta a essa pergunta essencial do ser humano: “para onde vamos?” Mais curioso ainda é constatar que a esmagadora maioria das teorias a respeito contradizem frontalmente o que a Bíblia afirma. A Bíblia afirma que somos o encontro de um corpo, feito do barro pelo próprio Deus, e do fôlego de vida que Deus sopra (Gênesis 2:7). Assim, o corpo sem o fôlego não é “alma vivente”. O fôlego sem o corpo também não é “alma vivente”. Uma alma, segundo a Bíblia, é a conjugação desses dois fatores. As Escrituras vão mais além quando afirmam que os mortos não sabem coisa nenhuma, não têm consciência, não têm parte alguma em nada que acontece no mundo dos vivos (Eclesiastes 9). O próprio Jesus compara a morte a um sono. Ora, quem está dormindo não está acompanhando o que acontece, muito menos intervindo e tomando parte nas idas e vindas dos humanos vivos.

Quer dizer que ao morrer eu vou para a sepultura? Meu espírito desencarnado não vai pra algum lugar, melhor ou pior? É exatamente isso. Mas em I Tessalonicenses 5 Paulo afirma que não queria que ninguém ficasse em ignorância quanto ao que acontece “aos que dormem”. Ele afirma que quando Jesus voltar a essa Terra, soará o brado e então todos os que morreram “em Cristo” ressuscitarão, ou seja, o corpo reconstruído reencontrará o fôlego de vida e essas pessoas voltarão a viver, dessa vez eternamente ao lado de Jesus.

Rob Bell tem razão quando afirma que ninguém sabe (empiricamente) o que acontece após a morte, mas não tem razão de afirmar que não temos como saber. Paulo disse que ninguém deveria ser ignorante quanto a isso.

Mas a resposta da Bíblia a essa pergunta é tão impopular porque é muito mais confortante acreditar na mentira do “certamente não morrerás” dito pela serpente a Eva e repetido à exaustão pelos séculos afora. É um alívio pensar que vou ter infinitas oportunidades de ser alguém melhor. Se não der nessa vida, tento na outra, então posso pensar em “ser alguém melhor” mais pra frente.

Conhecer o que as Escrituras falam sobre a morte tem como primeiro efeito em nós nos confortar com a certeza do reencontro com nossos queridos que já foram, dormindo em Cristo. O segundo efeito é nos fazer entender que esta vida não é brinquedo. Com a vida não se brinca! Ela é a única bala da agulha, nossa única e final oportunidade de escolher a vida de verdade, a vida eterna.

Estamos sendo constantemente lembrados de que a qualquer momento nossa vida pode ser ceifada. Somos frágeis, somos vulneráveis. Se entendermos que com a vida não se brinca, não adiaremos mais a mais importante das decisões.

É o que lhe desejo hoje.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Canção para Pedro

Canção para Pedro
 
Sabe, Pedro
Desde cedo
Quando soube que você viria
Gastei horas pensando
No que lhe ensinaria
Nas coisas que você precisa saber
Sobre esta vida
E pra que você comece
Bemv
Queria que soubesse
Que
 
Sucesso é amar e ser amado
A paz é o dom supremo
Felicidade não se vende no mercado
Amizade muito menos
Nunca tenha preguiça
De fazer o que é certo
Mantenha sempre a família
E quem se ama por perto
Consuma diariamente
Água, Bíblia e salada
Evite determinadamente
O pecado, o rancor, mais nada
Nunca, por medo da sujeira
Evite uma amoreira
E tome sempre que der
Banho de cachoeira
Nunca faça a besteira
De ignorar um céu estrelado
E tudo que você quiser
Vá atrás, não fique parado
Consuma sem moderação
Livros, amizade e oração
E quando a solidão apertar
Confie em Deus e o mais ele fará
 
Sabe, Pedro
Desde cedo
Quando soube que estava a caminho
Gastei horas orando
Pedindo, implorando,
Pressenti que esse discurso
Pra ser assimilado totalmente
Requer mais que palavras
Mas uma vida coerente
E enquanto juntos temos tempo
Peço a Deus, me faça exemplo
Me faça feliz como ninguém
Pra você querer ser feliz também
Amém.
 

(Pedro nasceu às 09:35 de hoje, com 3,490 kg e tamanho ainda incerto, está ótimo e a mãe também. O pai está meio desidratado de tanto babar, mas a opinião geral é de que sobreviverá. Já se instalou uma saudável polêmica sobre quem ele puxou e estamos explodindo de gratidão a Deus. Rejubile-se conosco)

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Os crentes também amam


Há algumas semanas eu comentei aqui, partindo dos textos em que Paulo nos adverte a ter uma postura de tolerância, cuidado e paciência com os irmãos da igreja, que Deus tem um interesse curioso em manter pessoas fracas, erráticas, chatas e inconvenientes na igreja, para nossa edificação, e que não devemos tentar fugir delas. Bem, talvez tenha chegado o momento de dar um passo além.

Em João 8:35 Jesus dá o sinal distintivo da verdadeira igreja na Terra. Talvez você esteja mais afeito aos textos do Apocalipse que dizem que a verdadeira igreja é aquela que guarda os mandamentos e a fé de Jesus, mas quando Ele próprio quis destacar qual o elemento distintivo de Sua igreja verdadeira para as dos falsos profetas, Ele afirmou: “nisso conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”.

Nós gostamos de falar de amor nos meios cristãos. Falamos dele o tempo todo. Fiz uma breve pesquisa com o auxílio do site da Sociedade Bíblica do Brasil e vi que apenas o livro de Tiago não menciona a palavra amor nem uma vez no Novo Testamento. Com uma tal ênfase, é difícil fugir do tema. O curioso é que nossa forma de enfocar esse assunto é frequentemente de forma vaga, dirigindo o amor “às pessoas”. “Pessoas”, assim, essa coisa indeterminada, sem rosto e que de preferência está bem longe. Pessoas que sofrem como o homem que o bom samaritano encontrou no caminho e aí pode ser que a gente tope com alguém numa situação semelhante algum dia... Contudo, outra coisa que essa minha pesquisa pelo tema do amor no Novo Testamento me revelou é que essa palavra é empregada geralmente no contexto da própria igreja.

Jesus disse que se alguém andasse por uma rua que tem muitas igrejas e passasse olhando lá pra dentro, iria poder reconhecer a igreja verdadeira pelo grau de afeição e amor que os membros dessa igreja têm uns pelos outros. Uns pelos outros primeiro, e só depois pelas “pessoas”, aquelas sem rosto que a gente pode um dia, talvez, encontrar (mas que tomara que não encontre).

Quando introduz sua brilhante ilustração da igreja como um corpo, Paulo afirma que a coisa funciona num tal nível de organicidade amorosa que “se um membro padece, todos os membros padecem com ele; e, se um membro é honrado, todos os membros se regozijam com ele” (I Coríntios 12:26), e aí a gente pensa na nossa igreja e vê que ela não funciona assim. Na minha igreja muitas vezes quando alguém sofre os demais parecem agir como se ficassem aliviados porque não aconteceu com eles e às vezes até assumem um ar superior que emula a ideologia teológica dos amigos de Jó. Na minha igreja, na maioria das vezes que alguém tem uma grande vitória – um emprego novo, uma boa promoção, a compra de uma boa casa, a assunção de um posto honrado, etc – essa pessoa vai ter que comemorar sozinha, porque os demais parecem sentir uma impossibilidade absoluta de ficar feliz por ela.

Penso que quando Paulo afirmou que a igreja seria o palco onde você seria chamado a exercitar paciência, tolerância e o dom de direção e advertência, falando em outros cantos que o tipo de sentimento que deveria imperar na igreja seria o amor, ele indicava que os fracos, aqueles que invejam e não amam, seriam a exceção, e não a regra.

Existe essa peculiaridade irritante do amor: ele é princípio. Ele não espera o outro ser amável para amar. Ele não espera sentir amor para agir como se amasse. Você decide amar as pessoas que o rodeiam em sua igreja. No resto Ele age.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

A diferença


Talvez a diferença entre o cristão e o mundo resida menos em ele fazer ou não fazer certas coisas que o mundo faz, usar ou não usar certas coisas que o mundo usa, e mais na relação que o cristão tem com essas coisas. É claro, há coisas que o mundo faz e usa de que o cristão se abstém em absoluto, mas há uma distinção radical, inda que sutil, entre o cristão e o mundo, uma distinção que é de outra natureza.
 Veja este intrigante texto de Paulo, achado no meio do ainda mais intrigante capítulo 7 de I Coríntios: “Irmãos, a coisa importante é lembrar que o tempo que ainda nos resta é muito curto. Por esta razão, aqueles que têm esposa devem viver como se não tivessem. Os que choram, como se não estivessem chorando; os que estão felizes, como se não estivessem; os que compram, como se não fosse deles o que compraram; os que tratam de coisas deste mundo, como se não estivessem ocupados com elas. Porque o mundo, em sua forma atual, bem depressa se acabará” (Bíblia Viva).
 Comentando este texto, o alemão Dietrich Bonhoeffer diz: “Tal é a vida da igreja no mundo. Cristãos vivem como outros homens: eles se casam, choram e se alegram, eles compram coisas e usam o mundo em sua existência cotidiana. Mas eles têm tudo através de Cristo apenas, nele e por causa dele. Assim, eles não estão ligados a isso. Eles possuem tudo como se não possuíssem. Eles não enterram seu coração em suas posses, mas são intimamente livres. É por isso que são capazes de usar o mundo sem ser retirados dele (I Coríntios 5:13). E é por isso também que eles podem deixar o mundo quando ele se torna um impeditivo ao discipulado... Eles vendem e se lançam no comércio, mas apenas tanto quanto suas necessidades cotidianas o exigem. Eles não acumulam tesouros e põem neles seu coração. Eles trabalham, porque não lhes é permitido permanecer ociosos. Mas seu trabalho não é, decerto, um fim em si mesmo. O trabalho pelo trabalho é uma noção alheia ao Novo Testamento”.
 Talvez mesmo a diferença fulcral entre o cristão e o mundo resida na forma como ele lida com o casamento, o trabalho, o comércio, as alegrias e tristezas da vida. Para ele, nenhuma dessas coisas é um fim. O casamento não é o que determina o “e foram felizes para sempre”, embora seja uma parte importante do cenário geral da vida; o sucesso no trabalho ou o dinheiro que dele advém não são o que determina o valor do cristão como pessoa – seu valor é encontrado na cruz de Cristo. Assim, o cristão não trabalha e não negocia para vencer o outro ou para se impor, o que determina em que ele utilizará um ferramentário e uma ética completamente diferentes dos que o mundo utiliza. E a alegria e a tristeza que aparecem no caminho do cristão, ele sabe, não são o fim e vão se alternar nesta vida enquanto estivermos no mundo. O cristão não se apega a um ou outro para encontrar o sentido da vida, porque sua vida já tem um sentido muito mais elevado, calcado na certeza do livramento alcançado na cruz e na esperança da vitória definitiva que é de Cristo e que está à frente, por mais um pouco de tempo (“o tempo que ainda nos resta é muito curto”!). Por isso o cristão não se desespera quando aquela alegria passa e não se ilude com a tristeza passa.
 A que você se apega de fato, @migo? À cruz de Cristo ou a algo transitório que o mundo sobrevaloriza? Apegue-se à cruz e tudo o mais vai encontrar seu devido lugar dentro de seu coração.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Até os malas


“Exortamo-vos também, irmãos, a que admoesteis os insubordinados, consoleis os desanimados, ampareis os fracos e sejais longânimos para com todos” (I Tessalonicenses 5:14). Essas palavras dirigidas por Paulo à igreja revelam uma verdade para muitos indigesta.
 Veja, Paulo está afirmando que a igreja deve ser um ambiente em que você esteja disposto a exercitar sua capacidade de admoestação, ou seja, de exortação, de direcionamento, de ensino, de correção de condutas equivocadas. Está conclamando você a exercitar na igreja suas habilidades consoladoras aos desanimados e que ampare os fracos. Ele afirma ainda que lá é o local onde devemos ser longânimos para com todos. Todos!
 A forma como esse verso aparece na Bíblia Viva é ainda mais eloquente: “Irmãos, admoestem aqueles que são preguiçosos ou rebeldes; confortem aqueles que estão atemorizados; tenham um carinhoso cuidado por aqueles que são fracos; e tenham paciência com todos”.
 A verdade indigesta escondida aqui é bastante simples: a igreja deve ser um lugar para gente preguiçosa, rebelde, amedrontada, fraca e (sim!) chata. Chata, porque com quem mais você deveria exercitar a paciência?
 Sei que você tinha vontade de promover uma limpeza emulando os esforços de eugenia nazista, tirando da sua igreja os chatos, os inconvenientes, os que falam na hora errada, os que se vestem de forma bizarra, os que vivem se lamuriando e os que não querem nada com nada, mas aí com quem você exercitaria a paciência, a consolação, a admoestação e essas coisas todas?
 O fato é que Deus quer que a igreja seja esse lugar heterogêneo, com uma multiplicidade de tipos gigantesca, em que nem todos demonstrem afinidades óbvias com você, e que, por alguma razão nem tão óbvia assim, Ele não quer você fugindo dessas pessoas, mas se relacionando com elas! Ele tem propósitos mais altos que passam pelo exercício da capacidade de aturar pessoas diferentes.
 Oswald Chambers coloca assim: “Na vida espiritual, cuidado para não andar de acordo com suas afinidades naturais. Todos têm afinidades naturais; de algumas pessoas nós gostamos, de outras não. Nunca podemos permitir que esse gostar ou desgostar governe nossa vida cristã. Se andarmos na luz como Deus na luz está, Ele nos dará comunhão com pessoas com quem não temos nenhuma afinidade natural”.
 É indigesto? Talvez sim, a princípio, como para muitos uma salada parece mais difícil de encarar do que uma pizza, mas expor-se à salada consistentemente acaba revelando alegrias insuspeitadas e com esse esforço para estar entre os chatos, preguiçosos, fracos e desanimados não há de ser diferente.