sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

O mestre em seu ofício

"Deus me fez com um propósito, mas também me fez rápido. Quando eu corro, eu sinto Seu prazer". A frase, que eu já citei em outra ocasião, é de Eric Liddell, um dos atletas britânicos que participaram dos primeiros jogos olímpicos da era moderna, cuja história foi contada no belo filme Carruagens de Fogo. Ele estava a ponto de embarcar como missionário mas decidiu adiar seu ministério para correr. Mas como Deus poderia ter prazer em alguém correr rápido?

Um dos subprodutos do dualismo, que cava um poço profundo entre o sacro e o profano, é o sentimento de que a única coisa que pode dar prazer a Deus é alguém pregar com eloquência ou cantar lindamente numa igreja. Reduzimos toda a lista de dons espirituais de Paulo, uma lista meramente exemplificativa, aliás, a esses dois, porque são os únicos dons que conseguimos ver em ação no ambiente da igreja.

Em Êxodo 31:3 Deus afirma haver enchido de Seu Espírito uma pessoa específica. Para que? Pregar? Fazer milagres? Profetizar? Não: para desenhar e executar trabalhos em ouro, prata e bronze, para talhar e esculpir pedras, para entalhar madeira e executar todo tipo de obra artesanal (v. 4 e 5). 

Você pode dizer: claro, nesse caso isso é um dom divino porque esse dom seria usado na construção do templo. Como se o Espírito de Deus atuasse desse jeito como uma exceção absoluta à regra de só tocar pessoas para pregar e cantar. Provérbios 8:31 diz que Deus se alegra com o mundo que criou e com a humanidade. Quando ela está pregando, unicamente? Acredito que não.

Você pode ficar chocado com o que vou dizer, mas adoro ver esses vídeos que as pessoas compartilham de mestres em seus ofícios porque vejo Deus neles. Tem o vendedor do algodão doce que esculpe coisas lindas com ele. Tem o cara que não se limita a abrir um coco, mas o entalha até ele ficar uma coisa linda e só então o serve. O último que vi é o cara que carrega o caminhão com botijões de gás usando só uma mão e jogando os botijões de longe até se encaixarem perfeitamente em seus lugares.

Um mestre em seu ofício é, pra mim, um lembrete do espírito criativo que herdamos dAquele de quem fomos criados à imagem e semelhança. Um mestre em seu ofício é um eco da excelência original em que fomos criados.

Se consigo abrir os meus olhos para ver o Espírito do Criador fora da igreja também (e eis que Ele se manifesta lá de muitas outras maneiras que não apenas no pregador e no cantor!), começo a divisar um Deus não encapsulado nos limites estritos daquilo a que chamo sagrado. E o sagrado desborda, como o leite fervendo. E a vida se torna sagrada. E um espírito de reverência, gratidão, alegria e solenidade me acompanha por onde vou (mesmo nos dias quando não é para a igreja que vou). E quando faço aquilo que faço muito bem e que se harmoniza com a Lei dEle, eu posso sentir o Seu prazer.

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