sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Um pouco mais pessoal

Hoje é dia de celebrar coisas como os sábados da Cidade Dutra, quando, com minha mãe e irmão, caminhávamos cruzando um campinho de futebol de várzea até a igrejinha simples, às vezes com lama até os calcanhares ou quando passávamos as tardes deitados nos colchões que mamãe colocava no quintal e ficávamos cantando e olhando as formas das nuvens ao som de fundo dos motores do autódromo de Interlagos. Coisas como os jacarés que pegava na praia de Maranduba, os almoços de família em Hortolândia, a sensação quente que me subia pela pele enquanto lia "Os três mosqueteiros" ou "Rei Arthur e seus cavaleiros". Coisas como o rubor na face quando aquela menina falava comigo, a vontade louca de conseguir comunicar minha frustração por alguma injustiça sofrida e também a vontade de mudar o mundo quando o César Augusto da minha classe do pré primário sofria bullying. Celebro as férias em Itapecerica da Serra, lendo Tintin e Asterix na barraca que meus amigos fizeram com as próprias mãos. Hoje celebro coisas como a descoberta do humor, a primeira vez que vi "Conan o Bárbaro" e fiquei impressionado por dias, as espinhas que começaram a surgir, o pasmo e a admiração que sentia quando terminei a primeira parte de "Olhai os lírios do campo", a sensação de desajustamento entre os surfistas da praia, os jogos de War e Scotland Yard e truco e os ensaios do coral jovem do IAE. Coisas como a sensação de completude na colportagem gelada de Novo Hamburgo-RS, o primeiro namoro, o primeiro rompimento dois meses depois, as tardes e às vezes dias inteiros jogando basquete, a vontade de explodir o mundo durante as aulas de Física do cursinho, o alívio do meu nome na lista de aprovados da faculdade e o discurso de formatura. Celebro a sensação de coração queimando enquanto estudava a Bíblia com amigos queridos, o grupo que liderei, a primeira vez que me deram um microfone e eu tremi feito celular em modo vibratório e a primeira vez que peguei na mão da Tatiana. As portas que não se abriram e as que se abriram convidando a passar por elas nos momentos que eu era mais hesitante. O choro de meu primeiro filho. Os primeiros sorrisos, os primeiros passos, os primeiros tudo e a história se repetindo e adquirindo novas tintas e camadas de profundidade uma, duas, três vezes! Os enormes olhos de minha filha, quando sorriem cheios de graça, o orgulho pelo que essas pessoinhas podem vir a ser. Celebro os outros livros que li e os que escrevi, os países em que pisei, os alimentos que provei, as coisas que já esqueci e aquelas que carrego com força por onde vou. 

Hoje celebro essas coisas e as milhões de outras que estão entre elas, nas lacunas.

Porque a vida é um presente tão fantástico que, se enfocada da perspectiva correta, nos faz perceber que com ela não se brinca. É um cristal delicado, uma coisa para segurar com as duas mãos, algo a ser protegido, velado, acalentado, cuidado.

Com o tipo de paixão que Aquele que me deu esse presente mostrou ao Se entregar para que eu vivesse essas coisas todas e, quiçá, algumas mais altas.

Obrigado, Senhor!

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