sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Outra casa

Há alguns meses lembrei em um destes textos de sexta-feira um dos meus contos favoritos, “Uma casa”, de Moacyr Scliar, que começa assim: “Um homem ainda não tinha comprado sua casa quando sofreu um ataque de angina de peito”. Eu o li há muitos, muitos anos, mas essa primeira frase ficou gravada em minha memória como tradução de um sentimento mais ou menos universal, o desejo de fincar raízes em um lugar, de ter a segurança de ser proprietário de um naco de terra.

Todos acompanhamos com diferentes graus de indignação e preocupação a desastrada reintegração de posse do bairro Pinheirinho, em São José dos Campos e também o desabamento dos três edifícios no centro do Rio de Janeiro nas últimas semanas. Para os moradores de Pinheirinhos, a expectativa de perenidade de sua propriedade era precária, já que o terreno era ocupado irregularmente, e os edifícios no Rio talvez não sejam a melhor ilustração para o que quero dizer, porque eram edifícios comerciais. Tomemos então aquelas famílias que viviam há décadas em casas devidamente regularizadas na serra carioca até o momento em que uma avalanche de barro levou tudo embora durante as chuvas do último ano. Em qualquer desses casos temos um lembrete inignorável: até mesmo aquilo que nos dá a maior sensação de segurança neste mundo é precário.

Todas as coisas neste mundo tendem ao desgaste, à desvalorização e, por fim, ao desaparecimento. Há algum tempo mudei com minha família para uma casa nova. Ela foi reformada e decorada, ficamos muito satisfeitos com o resultado de nossos esforços, mas menos de um ano depois a pintura já começa a demonstrar sinais de desgaste. Tentei aqui imaginar um futuro, espero que bem distante, em que nós não estejamos mais aqui e em que esta casa, que hoje é cheia de vida, esteja entregue às teias de aranha e ao pó; o resultado desse exercício de imaginação foi um princípio de depressão.

O apóstolo Paulo foi atingido por esse estado de espírito também, mas tinha uma ótima resposta a dar: “Porque sabemos que, se a nossa casa terrestre deste tabernáculo se desfizer, temos de Deus um edifício, uma casa não feita por mãos, eterna, nos céus” (II Coríntios 5:1). O contexto deixa claro que ele não está se referindo a uma casa, mas ao nosso corpo, com seus sinais de velhice que apontam para um fim inexorável, mas a conclusão é a mesma: tudo que nos rodeia e tudo pelo que lutamos aqui é precário, fugaz, tendente ao desaparecimento. A menos que estejamos lutando pela casa não feita por mãos, eterna.

Sensação de segurança? Só se, antes das coisas que desaparecem e que nos conferem alguma segurança, tivermos cuidado das que são eternas e não poderão nos decepcionar.

Por qual tipo de coisas você corre hoje?

Um comentário:

Jakie Hein disse...

"Oh, que paz perdemos sempre,
Oh que dor de coração...
Só porque não recorremos,
Ao bom Deus em oração."
Depois de um dia de cobranças, e desgastes não eh facil dedicar tempo ás coisas que perduram, Graças a Deus pelo sábado, e por amigos queridos que nos inspiram. FELIZ SÁBADO!