sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Jesus e as armadilhas

O capítulo 20 de Lucas narra três tentativas de fazer Jesus cair em uma armadilha retórica. 

Na primeira, os "principais sacerdotes e os escribas, juntamente com os anciãos" (exatamente os que presidiriam Seu julgamento cheio de irregularidades jurídicas dias depois) vieram perguntar com que autoridade Jesus fazia "estas coisas" (basicamente, ensinar e curar). Mas ainda não era hora de Ele ser aprisionado e morto. A "plenitude dos tempos" estava designada para dali a alguns dias, durante a Páscoa. Então Jesus devolveu a pergunta com outra pergunta: "Respondo se me disserem de onde era o batismo de João; da Terra ou do Céu?" Eles pedem um tempo pra confabular e acabam respondendo algo que o povo não estava acostumado a ver nos lábios deles, tanto como hoje é muito difícil encontrar um pastor capaz de dizer essas simples palavras: "não sabemos". Se respondessem dos homens estariam se contradizendo, se respondessem do Céu, o povo se rebelaria contra eles...

Eles então subornam pessoas que pareciam muito pias e justas para questionar Jesus se deveriam pagar impostos a Roma. Jesus responde com o famoso "dai a César o que é de César" e eles mais uma vez ficam sem ter o que dizer: "admirados de sua resposta, calaram-se" (verso 26).

Na terceira ocasião são os saduceus que se aproximam com uma questão doutrinária, certos de que pegariam Jesus em contradição. Eles não acreditavam na ressurreição, eram uma espécie de agnósticos daquele tempo, para quem essa vida é tudo o que temos. Jesus então responde à questão da mulher que foi casada com sete irmãos, viúva seis vezes, com uma rara descrição de algo que acontecerá depois que o pecado houver passado - e que desarmava maravilhosamente a armadilha deles.

É no contexto desses confrontos todos que Ele conta a parábola dos lavradores maus (versos 9 a 18), uma impiedosa descrição da inteligentsia religiosa e sua cegueira espiritual.

Termino a leitura de Lucas 20 com a forte impressão de que ler apenas o sermão do monte me daria uma visão enviesada do Cristo. Dar a outra face e andar a segunda milha não nos torna idiotas, desprovidos de malícia e totalmente avessos ao confronto. Às vezes precisamos responder com algo parecido com "Pois nem eu vos digo com que autoridade faço estas coisas" (verso 8). 

Que Deus nos dê sabedoria para discernir quando é hora de usar o amor e quando é hora de agir como quem diz: "eu sei o que você está pretendendo. Me respeite e respeite ao Deus a quem sirvo".

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

O outro reino

Mas o que o me interessa mais é o outro reino. 

Aquele sobre o qual Jesus falava: "Desde então Jesus começou a pregar, e a dizer: Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus" (Mat. 4:17). Aquele que era o tema central de Suas parábolas ("o reino dos céus é semelhante a..."). Aquele que está no epicentro da pregação que será o último grande acontecimento da história deste mundo e que colocará um ponto final na sucessão de pequenos reinos, como esse do PT aí: "Este evangelho DO REINO será pregado a toda nação, língua e povo, em testemunho a todas as gentes, e então virá o fim" (Mat, 24:14).

E, por me interessar o reino e o que ele realmente significa, me intriga que Jesus tenha dito tão claramente: "O reino de Deus está entre vocês" (Lucas 17:21). Mesmo se considerarmos outras versões, em que a tradução é "O reino de Deus estão dentro de vós", está instalada uma dúvida. Sim, porque somos comandados pelo mesmo Jesus, na oração do Pai nosso, a orar "venha a nós o vosso reino"

Por que eu tenho que pedir a vinda do reino? Ele já não está em mim ou perto de mim?

Penso que a chave para solucionar essa questão esteja na forma como Mateus resumia o discurso de Jesus lá no começo de Seu ministério público, e que ecoava o mesmo discurso de João Batista: "arrependei-vos". Porque o reino está próximo. Porque, para entrar no reino, arrependimento é uma condição sine qua non. Porque o pedido "venha a nós o vosso reino" é seguido de perto por outro pedido, mais duro de fazer: "seja feita a Sua vontade".

O reino de Deus, amigos, o ambiente em que Ele realmente reina, aquele no qual podemos entrar já agora, porque está perto, está acessível, está à mão, é o reino em que a vontade dEle é feita. 

A mensagem que será pregada em testemunho ao mundo, porque vivida na prática, é a mensagem de que é possível - e altamente recomendável - obedecer a Deus, de que é possível arrepender-se de nossas ilusões de autonomia e autodeterminação. 

A porta do reino de Deus está escancarada para você. Trata-se do reino que está instalado em versão beta, mas que não passará, será eterno. Trata-se do reino em que a paz mais sublime impera e onde toda lágrima será enxugada definitivamente. O único bilhete para entrar nele que está sendo requerido de você é orar: meu Deus, me ajuda a querer realmente que a tua vontade seja feita, tanto na Terra como no Céu.

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

O método Brainerd

Qualquer grupo cristão que não esteja preocupado primeira e primordialmente em fazer discípulos está descumprindo a missão que foi dada pelo Mestre e os efeitos disso são devastadores. Essa foi a primeira grande conclusão que tirei do "Discipleship BluePrint", uma espécie de treinamento fornecido pela equipe do pr. Robby Gallaty, da Brainerd Baptist Church, em Chattanooga, no estado americano do Tennessee, sobre como implementar uma estratégia de discipulado na igreja, e que aconteceu no último final de semana.

Robby, um sujeito ainda novo (na casa dos 30) com cerca de dois metros de altura e físico de vilão sarado de filme de heróis, era viciado em cocaína quando foi resgatado por Cristo. Hoje pastoreia uma igreja vibrante com 3.500 membros e tributa essa transformação ao discipulado, essa preocupação com não apenas fazer membros de igreja, mas de formar discípulos. Alguém não se limitou a lhe dar estudos bíblicos, mas a acompanhá-lo semanalmente por anos até que ele estivesse apto a fazer o mesmo por outros. Não é por acaso que dentre os líderes de sua igreja existem outros ex-dependentes químicos e até mesmo ex-presidiários que hoje desenvolvem um ministério fantástico no bairro em que estão e também em prisões.

O modelo de discipulado que eles defendem é aquele no qual cristãos mais maduros se reúnem semanalmente com no máximo 4 outras pessoas para servir-lhes de mentor, de discipulador. O número de 3 a 5 pessoas é inspirado naquele grupo de discípulos mais próximo de Jesus, Tiago, João e Pedro, que Ele permitia participar de coisas que vedava até mesmo aos demais dos doze. Além dos encontros semanais, duas iniciativas ocupam um lugar de destaque no sistema de discipulado deles: memorização de textos bíblicos (de preferência capítulos inteiros) e formação de um diário.

A arte de memorizar há muito que se perdeu em razão das facilidades do mundo digital e com isso deixamos de experimentar os impactantes benefícios para nossa vida espiritual de ter um texto sendo repetido mentalmente dezenas de vezes. A Bíblia em áudio no carro, cartõezinhos com o texto à mão e diversas outras iniciativas podem fazer mais por nossa vida espiritual do que o consumo de duzentos sermões.

O diário é uma maneira de registrar (e com isso assimilar melhor) aquilo que foi lido nos momentos de leitura diária da Bíblia. Cada verso que chamou a atenção é destacado ali, com um comentário sobre dúvidas ou insights e o registro de decisões tomadas a partir do que se apreendeu. Sem isso, as chances de tudo o que você esteve lendo se dissipar nos minutos imediatamente seguintes é enorme.

Nas reuniões de discipulado, além de discutirem os diários de cada um da semana e de trocarem os textos decorados, os discípulos oram uns pelos outros e se fortalecem. 

A essas alturas você acumulou uma série de desculpas ou de justificativas para não colocar nada disso em prática. Que tal, antes de deixar isto aqui de lado e voltar à luta, fazer uma oração e perguntar a Deus se há algo nisso que Ele realmente deseja para sua vida? Quem sabe esta não é a verdadeira luta que você deve lutar?

Leia mais sobre o método Brainerd em http://replicateministries.org/about/ 

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Segundo turno

Dentre tantas filosofias e visões de mundo que disputaram a sua consciência, você foi conduzido ao momento em que precisa escolher entre crer e não crer.

A plataforma de governo do “não crer” é bastante persuasiva. Se ela ganhar esse segundo turno, você vai ter descompromisso, indolência, condescendência e não vai correr o risco de parecer um idiota perante tantos outros que votaram nele também.

A plataforma do “crer”, contudo, aposta no longo prazo. Para agora ele só oferece paz, mas sabendo que há uma paz genérica e sintética no mercado com que muitos se satisfazem. O filé mignon de sua plataforma, contudo, está diferido para algum momento no futuro. Vida eterna e justiça.

No debate entre os candidatos, o “não crer” afirma, sarcástico: quem quer justiça? E diz que a vida eterna é uma ilusão, ninguém nunca esteve lá pra saber se existe.

O “crer” não discute. Ele olha nos olhos do eleitor e diz: não tenha medo. Simplesmente creia. Não tenha medo.

E, olhando fundo nos olhos dele, você vê as respostas a todas as objeções do seu opositor.

E a urna não tem espaço para votos brancos ou nulos.

E o Universo inteiro está na expectativa do seu voto.


sexta-feira, 3 de outubro de 2014

A urna e eu

Se eu pudesse fazer um gráfico do meu interesse nessa campanha eleitoral, numa escala de 1 a 10 ele sairia de algum número negativo há 3 meses para algo como 6 há dois meses e então a curva cairia para algo como 2 hoje. Fico observando a timeline do Facebook e cismando como algumas pessoas que não são ligadas diretamente a algum grupo político demonstram tanta convicção de que há algum candidato realmente muito melhor que o outro, embora concorde com muitos que há um evidentemente pior.

Quando olhamos os problemas de nosso país e somos suficientemente honestos (intelectualmente, ao menos, vá lá) para reconhecer que o sistema político não admite mudanças radicais para melhor, que a corrupção é endêmica e está em todas as classes,  não apenas na política, que o ideal da nação é ganhar muito trabalhando pouco e tantos outros indiciadores amargos, a tendência natural é a apatia e aquele típico desinteresse que nasce da desilusão (algo que só afeta quem um dia foi iludido). Como cristão, a tendência adicional é dar de ombros e dizer que esse mundo não tem jeito mesmo, que devemos esperar pelo Reino eterno para que as coisas se ajustem, o que acarreta alienação total da política deste mundo aqui.

Esse cristianismo essencialmente místico e futurista tem um problema sério: ele não casa com a Bíblia e suas constantes advertências contra juízes parciais, contra religiosos indiferentes ao sofrimento dos desfavorecidos e contra a opressão e o abuso do poder e da autoridade. São afirmações políticas em sua essência. 

Notamos isso com mais destaque quando consideramos que se todos os cristãos fossem indiferentes à política ainda teríamos escravos e embora bandeiras como a dos direitos das mulheres e das liberdades individuais tenham sido defendidas também com ênfases humanistas e ateístas (e antagonizadas em um contexto cristão), o evangelho de Cristo as impulsionou barbaramente.

É por isso e tanto mais que, às vésperas de mais uma eleição, me estapeio pra ver se acordo desse marasmo e tomo parte nos destinos imediatos de minha nação e estado. Quem disse que refletir no que seria menos pior é um esforço inútil?

Bom seria se esse estado de atenção com a política deste mundo tivesse alguma ação não apenas no tempo da eleição, mas eu chego lá.

Bem, como tantas vezes, escrevi tudo isso mais para mim do que para qualquer outra pessoa. Desculpem a chateação.