sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Entre os mortos

Lucas 8:1 diz que Jesus andava de cidade em cidade e de aldeia em aldeia. No mesmo capítulo vemos que chegou a vez de Gadara. O comitê de recepção da cidade para Jesus e seus discípulos foi um (ou dois, conforme Mateus) endemoninhado que vivia num estado deplorável. Nu, vivia no cemitério da cidade “clamando” por entre os túmulos e se ferindo.

Ao restituir aquele homem a uma condição de dignidade, Jesus ganhou a inimizade dos gadarenos. Eles sofreram um prejuízo econômico com a destruição de uma manada de porcos para onde os demônios que atormentavam aquele homem se transferiram; então, eles preferiram continuar com seus doentes e aflitos, mas com seus rebanhos intactos, a ter Jesus ali por mais tempo.

Na sequência acontece o único episódio de que me lembro em que Jesus diz “não” a alguém que quer segui-lO. Aquele homem, curado, restituído à razão e cheio de gratidão, quer continuar seguindo Jesus, mas Jesus ordena que continue ali. O nome disso é graça. Os gadarenos não queriam mais Jesus, mas Jesus continuava querendo os gadarenos. Ele deixou no meio deles um lembrete eloquente do que acontece quando Ele entra em um lugar: libertação e cura, coisas melhores do que porcos.

Com quem você seria capaz de se identificar nessa história? Com os criadores de porcos? Com os discípulos indignados com o tratamento que recebem dos gadarenos? Deixe-me dar uma outra sugestão: que tal o endemoninhado?

Quando estamos longe de Jesus também andamos nus, porque a nossa justiça própria é “como trapos de imundícia” (Isaías 64:6). Quando estamos longe de Jesus nós também andamos entre os mortos, preferimos estar com os mortos espirituais, aqueles que “têm fama de que vivem mas estão mortos” (Apocalipse 3:1). Para estes, Jesus diz “deixe que os mortos enterrem seus mortos” (Lucas 9:60). Quando estamos distantes dEle, nós nos ferimos sem perceber, nos machucamos, nos fustigamos, nos vilipendiamos e diminuímos a uma situação de degradação - e o triste disso é que muitas vezes em nossa ignorância e cegueira chegamos a nos orgulhar desse estado.

Talvez haja, perto de você, alguém que estava nessa situação mas não está mais. Saiba que ele é um lembrete de Jesus a respeito do tipo de sonho que tem a seu respeito. Saiba que ele é uma pergunta ambulante para você: “e aí? O que realmente vale a pena neste mundo? Seus porcos ou a presença de Jesus?”

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Enquanto a manhã não vem...

Um belo dia Jesus chamou à parte Seus doze discípulos para os mandar numa missão. Essa missão envolvia expulsar demônios e curar doentes e requeria uma coisa rara: coragem. Foi por isso que, ao final das orientações para essa missão, Jesus os encoraja dizendo: "O que vos digo no escuro, dizei-o na luz; e o que escutais ao ouvido, pregai-o sobre os telhados" (Mateus 10:27). O contexto dessa frase é entendido com a frase que vem a seguir ("Não temam os que matam o corpo e não podem matar a alma"), mas hoje peço que você me permita tirá-la do contexto para focar em um fato curioso que Jesus coloca: há coisas que Ele nos fala no escuro.

Nossa geração tem cada vez menor tolerância à dor. Os gráficos de vendas dos analgésicos provavelmente endossem essa minha percepção. Nossa reação à dor de nossos filhos é escandalosa e somos cada vez mais intolerantes com nosso próprio sofrimento, o que gera uma percepção coletiva de que a dor é uma exceção à regra geral de conforto, um corpo estranho, algo que pode ser evitado e extirpado. Bem, a Bíblia não ratifica essa conclusão, ao contrário, Jesus é claro quando elimina qualquer ilusão nesse sentido ao estatuir, simplesmente, que "no mundo tereis aflições"(João 16:33).

É por isso que pode servir de consolo eficaz saber que há algumas coisas que Jesus nos fala nesses momentos de escuridão, coisas que só poderíamos ouvir nesse estado de coisas. Oswald Chambers vai além e observa que os momentos de escuridão são aqueles nos quais não deveríamos abrir a boca, pois se o fizéssemos falaríamos com o humor errado. "A escuridão é o tempo de ouvir", ele afirma. Talvez porque a escuridão é o momento mais propício para ouvirmos as coisas com humildade, coisas que em outros momentos teríamos dificuldades sérias para digerir.

"O choro pode durar uma noite, mas a alegria vem pela manhã" (Salmo 30:5). Há noites, é inescapável; enquanto o senhor deste mundo não for julgado será assim. Por que você não as aproveita? Por que não faz uso delas para, quando a manhã chegar, encontrar uma outra pessoa esperando pela alegria, uma pessoa melhor, mais íntima de Deus e mais confiante na forma como conduz sua vida?

sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Quem pergunta quer ensinar 5

Mas, quando o assunto são as perguntas que Deus faz, não há competidor à altura dos capítulos 38 a 41 de Jó. Nesses quatro capítulos eu contei rapidamente algo como 66 perguntas. É uma saraivada,uma metralhadora de questões feitas por Deus a Jó. Deus pergunta coisas como “Onde estavas tu quando eu lançava os fundamentos da terra? Acaso tu entraste até os mananciais do mar, ou passeaste pelos recessos do abismo? Sabes tu o tempo do parto das cabras montanhesas? Acaso deste forças ao cavalo ou revestiste de força o seu pescoço? Podes levantar a tua voz até as nuvens, para que a abundância das águas te cubra ou ordenarás aos raios de modo que saiam?” Mas talvez a pergunta mais desconcertante seja a primeira: “Quem é este que escurece o conselho com palavras de conhecimento?” Esta pergunta encontra eco na que inaugura o capítulo 40: “Contenderá contra o Todo-poderoso o censurador?” Ou seja: “Quem é este? Quem é este que está questionando seu Deus?

Jó tem sido louvado pelos séculos pela sua paciência, mas quem cunhou a expressão “paciência de Jó” decerto parou a leitura no capítulo 2 do livro. Nos demais todos vemos um homem lutando, discutindo, esbravejando, insistindo com Deus por uma resposta para a razão do sofrimento. Aquela enxurrada de perguntas é a resposta.
Curioso que você e eu sabemos a razão do sofrimento dele. Nós temos os dois primeiros capítulos do livro, sabemos que Jó foi fustigado por Satanás, que estava tentando provar a Deus que a obediência de Jó era fruto da proteção divina. Foi por isso que seus filhos morreram, que ele perdeu todos os bens e que foi atingido por horríveis feridas de pele. Mas ele não sabia disso e, a julgar pelo final do livro, morreu sem saber. Quando Deus lhe apareceu, fez-lhe aquele monte de perguntas sem resposta, virou as costas e Se foi.

Jó deixa claro que questionar, lutar, esbravejar não é um pecado. Deus restitui tudo o que Jó tinha antes em dobro e o livro é claro em dizer que Jó não pecou com seus lábios. Perguntar os por quês dessa vida não é um pecado. Reprimir a pergunta é um erro, porque a pergunta é humana, nós queremos entender e fingir que isso não faz diferença é hipocrisia, aquela coisa que Deus odeia. Mas Jó também deixa claro: nem sempre haverá respostas. Na sabedoria de Deus Ele vê que na maior parte das vezes o que nós precisamos não é de respostas. É uma oportunidade para confiar nEle. Entender as coisas nunca salvou ninguém. Confiar em Deus nunca deixou ninguém sem ser salvo.

Quando Deus atirou sobre Jó aquelas quase 70 questões num fôlego só, se Jó apurasse os ouvidos escutaria que a mensagem era: “minha graça te basta. Confia em Mim.” Deus não queria saber o tempo de parto da cabra montanhesa, Ele o sabia muito bem. O que Ele queria com Jó e continua querendo hoje com você é lhe fazer ver que chega uma hora em que é preciso parar de se debater e debater; é preciso acalmar o coração e fazer a mais importante de todas as escolhas: confiar nEle.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Quem pergunta quer ensinar 4

Outra pergunta interessante de Deus aparece lá em Jonas. No capítulo 4, duas vezes Ele lhe pergunta “é razoável essa tua ira?” A primeira vez (Jonas 4:4) é quando Jonas se revolta por Deus haver desistido de destruir Nínive ao vê-la arrependida. Jonas chega a pedir para Deus matá-lo. A segunda (Jonas 4:9) é quando morre a planta que havia nascido ao lado da cabana de Jonas e que lhe fazia uma sombrinha benfazeja.

Aqui, nitidamente, a intenção do questionador não é conseguir alguma informação, mas provocar uma reflexão necessária. Na primeira vez Jonas não responde nada, apenas sai da cidade e faz uma cabaninha, como quem diz: vou ficar aqui até Deus mudar de ideia outra vez. Na segunda ele não aproveita a chance dada por Deus para refletir melhor. Ele responde: sim, é muito razoável a minha ira (verso 9)! Na sequência Deus mostra o quão irrazoável era sua ira. Argumenta que Jonas estava irado pela morte de uma aboboreira mas estava louco para ver a morte de mais de 120 mil pessoas e muitos animais.

A ira de Jonas nasce do fato de ele ter expectativas muito firmes a respeito de Deus. Ele quer que Deus aja de uma forma específica. Qualquer coisa fora dessa moldura que ele tem na cabeça lhe parece inaceitável. Ele prefere morrer a ter de lidar com a ideia da existência de um Deus diferente do que ele entende que é o correto ou adequado.

Os discípulos de Jesus também alimentavam expectativas erradas a respeito dEle e por isso caíram em depressão profunda quando tudo aconteceu de forma diferente, e o fato é: as coisas acontecem de forma diferente da que esperamos muito frequentemente! As coisas não saíram como José havia planejado; de repente ele era um escravo no Egito. As coisas não saíram como Saulo havia planejado; de repente ele era um apóstolo perseguido, apedrejado e por fim aprisionado e decapitado. As coisas não saíram como Pedro havia sonhado, nem como Moisés havia planejado e absolutamente nada tinha acontecido como Daniel costumava fantasiar em sua infância lá em Jerusalém.

Quando algo sai do trilho que você deseja e acha que merece ou que é mais justo, Deus pergunta: é razoável essa tua ira? Você não deveria reagir de forma coerente com o fato de que Eu sou Deus e você não é?

Deixe Deus ser Deus. Ele é muito melhor do que você nisso!